Salvem os "gatinhos-do-mar"!

A propósito do post do Manuel Sant`Ana sobre o site que promove a pesca sustentada, deixo-vos aqui a visão de um grupo activista(-extremista?) sobejamente conhecido e mediático sobre a questão das pescas.

Do lado deles, devo admitir que vejo muita gente ter mais problemas éticos com o consumo de carne que de peixe, ainda que estes sofram provavelmente mais e por mais tempo ao ser pescados (pelo stress, asfixia, desidratação, insolação e/ou descompressão sentidos) que um porco com o abate por exemplo, se feito humana e devidamente.

A PETA-People for the Ethical Treatment of Animals argumenta que a razão pela qual isto acontece se relaciona com a nossa apreciação estética do peixe como um animal. Vai daí, sugerem que deixemos de pensar neles como peixes, mas antes gatinhos-do-mar. E ninguém atravessaria um anzol pela boca de um gatinho, pois não?

Ainda não decidi completamente se isto é um golpe publicitário de génio, ou simplesmente absurdo. Provavelmente, está simultaneamente no limiar de cada uma destas duas visões.

Os “gatinhos do mar” (banner do site http://features.peta.org/PETASeaKittens/

Será o melhor o leitor julgar por si mesmo, acedendo ao site da PETA dedicado a esta causa. A primeira coisa que irá notar, certamente, é o facto de ser deliberadamente orientada para um público jovem, pela grafia, os textos e as histórias sobre estes “gatinhos-do-mar” que disponibilizam.

People don’t seem to like fish. They’re slithery and slimy, and they have eyes on either side of their pointy little heads—which is weird, to say the least. Plus, the small ones nibble at your feet when you’re swimming, and the big ones—well, the big ones will bite your face off if Jaws is anything to go by.

Of course, if you look at it another way, what all this really means is that fish need to fire their PR guy—stat. Whoever was in charge of creating a positive image for fish needs to go right back to working on the Britney Spears account and leave our scaly little friends alone. You’ve done enough damage, buddy. We’ve got it from here. And we’re going to start by retiring the old name for good. When your name can also be used as a verb that means driving a hook through your head, it’s time for a serious image makeover. And who could possibly want to put a hook through a sea kitten?

Que Peixe Comer?


Que diferença faz para o planeta Terra as opções gastronómicas que tomamos todos os dias? Para quem gosta de comer peixe, a Liga para a Protecção da Natureza criou a plataforma electrónica “Que Peixe Comer… para um Consumo Sustentável?”. Este projecto, que conta com o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian, pretende providenciar informação útil e prática para se consumir peixe de forma responsável. A ferramenta pedagógica é agradável de utilizar e o design é informal e apelativo. Ficamos a conhecer algumas das principais espécies de peixe da nossa costa, métodos de pesca utilizados, receitas culinárias e dicas para se escolher peixe sem danificar os ecossistemas marinhos. A versão experimental já está disponível e as opiniões são bem vindas!

The Blue Dog Project

A APMVEAC (Associação Portuguesa de Médicos Veterinários Especialistas em Animais de Companhia) lançou a versão portuguesa de “THE BLUE DOG” ferramenta educacional interactiva que visa ensinar crianças entre os 3 e 6 anos de idade a lidar e viver de forma segura com o seu animal de estimação. A maioria das mordeduras provocadas por cães ocorre em casa e envolve crianças. Estudos científicos apontam o dedo ao comportamento desajustado da criança face ao animal especialmente em idades precoces. Saiba mais aqui.

Vê a dor nos olhos do ratinho ?

Em The expressions of the emotions in man and animals, Charles Darwin defendeu a existência de mecanismos universais para a expressão de sensações como dor e que ultrapassam as fronteiras inter-espécies. Baseou esta ideia na sua teoria da evolução através de selecção natural, mas também na sua própria investigação empírica. Através de um questionário enviado a compatriotas que trabalhavam em diversas partes do mundo, Darwin verificou que, da mesma maneira que os europeus elevavam as sobrancelhas, coravam, torciam o nariz e encolhiam os ombros, assim faziam também os malaios, os afro-americanos, os maoris e os índios. Agora sabemos ainda que bebés recém-nascidos e pessoas com cegueira congénita mostram as mesmas expressões faciais que humanos adultos saudáveis, o que corrobora que estas expressões sejam congénitas e genéticas, ao invés de aprendidas e culturalmente transmitidas.

Mas serão tão universais que as encontremos também em outras espécies? Darwin achou que sim, e o livro dele é rico em ilustrações disto. Outros exemplos ainda podem ser encontrados na exposição Exuberâncias da Caixa Preta a decorrer no Museu Soares dos Reis no Porto.

“Cat, savage and prepared to fight. Drawn from life by Mr. Wood.”
(De: http://darwin-online.org.uk/content/frameset?itemID=F1142&viewtype=text&pageseq=1)


O argumento evolutivo é que, se as expressões faciais são congénitas e genéticas em nós, então deverão também existir em espécies que nos são próximas. Se a capacidade de expressar sentimentos nos traz vantagens evolutivas, as mesmas deverão também ser benéficas para outras espécies. Ou não? Não é óbvio que assim seja. Para quem é muito pequeno e com muitos inimigos, poderá ser melhor não assinalar fraquezas. Um ratinho com dores será certamente uma presa mais fácil, mas será desnecessário dizer “ai!” arriscando-se a que o gato ouça.

Nos cursos para investigadores que pretendem trabalhar com animais, ensinamos que é difícil identificar sinais de dor num ratinho, porque há uma vantagem evolutiva para presas naturais esconderem sinais de dor e doença. Mas num artigo na ultima edição da revista Nature Methods um grupo canadiano de investigadores mostra que, se observamos bem, podemos ver dor expressa na cara do ratinho.

O professor Jeffrey Mogil e a sua equipa de investigação sujeitaram ratinhos de laboratório a uma série de testes que são usados na investigação em dor. Nestes é induzido dor de grau e duração variável através de injecções ou intervenções cirúrgicas. Os ratinhos foram filmados e dos filmes extraíram-se imagens onde apenas a cara – e não o corpo do ratinho – era visível. Mostrou-se uma mistura de imagens de ratinhos com e sem dor a um painel de pessoas que não sabiam a que tratamento os ratinhos tinham sido sujeitos e, partindo de escalas de classificação para expressões faciais humanas, o painel avaliou a expressão dos ratinhos.

A avaliação do painel correspondeu ao tratamento do ratinho em até 97% dos casos quando se usou uma câmara de alta definição. Parece ser sobretudo dor de duração média, entre 10 minutos até 12 horas, a que melhor se reflecte na expressão facial do ratinho. Esta expressão envolve um semicerrar dos olhos, uma extensão arredondada da pele visível na ponta do nariz e um empolar das bochechas. O ratinho ainda estira as orelhas e os bigodes para trás, de encontro à cara ou para a frente, como se suspensos na ponta. Faltam-nos bigodes e orelhas movíveis, mas no que diz respeito a olhos, nariz e bochechas partilharmos a expressão facial com o ratinho.


Expressão facial de dor no ratinho. A escala de 0 a 2 corresponde ao nível de dor.

Figure kindly provided by Jeffrey Mogil and not-for-profit reproduction licensed by Nature Publication group. Originally published in Nature Methods 7, 447-449, 2010.

O mesmo grupo de investigação já mostrou anteriormente que ratinhos reagem quando outros ratinhos são sujeitos a dor e faz ainda referência a resultados ainda não publicados que mostram que ratinhas se mantém próximas de um familiar com dor.

Estes resultados não são, evidentemente, prova de que um ratinho que expressa dor de maneira semelhante a um ser humano sinta a dor de maneira semelhante. Mas parece-me que fica cada vez mais difícil argumentar que os outros mamíferos não sentem dor de uma maneira com que precisemos de nos preocupar.

Ensinamos os investigadores a reconhecer que se a intervenção seria dolorosa num ser humano, deveremos assumir que o seja também noutro animal. No futuro pode ser que acrescentemos “se achar que dói, olhe o ratinho nos olhos”.

"Deus criou os animais para experimentação"

As palavras são do governo da Malásia, em resposta a protestos de associações de protecção animal contra a construção de um novo centro de biotecnologia. Observo com interesse que a polémica, relatada na imprensa internacional, parece ter muitas semelhanças à do proposto biotério da Azambuja. E com a satisfação de que aqui nenhum representante do governo responderá com referência à vontade divina.

Darwin e a experimentação em animais – Parte II

Passou já muito tempo desde a minha primeira introdução a este tema.
Retomo agora o mesmo, começando por traçar um retrato de Charles Darwin, muito concretamente no que diz respeito à sua aversão à visão do sofrimento, de seres humanos ou de qualquer outro animal. A terceira parte dirá respeito ao papel de Darwin no debate sobre a vivissecção como partidário dos fisiologistas, algo que alguns movimentos activistas optam por ignorar, quando o citam como sendo anti-vivisseccionista.
Darwin nutria afecto por muitas espécies animais – e muito em particular pelos seus cães – o que não raras vezes levou a que perdesse as estribeiras sempre que via alguém maltratar qualquer criatura. Francis Darwin, seu terceiro filho, relatou vários episódios em que seu pai teria reagido vigorosa e violentamente contra tratamento indevido dado a cavalos, tendo mesmo chegado a saltar da sua carruagem para o fazer. Aliás, Francis falava também sobre o dia em que um cocheiro disse a alguém queixoso pelo atraso de Darwin que se tivesse chicoteado ainda que minimamente o cavalo, o eminente cientista teria saltado da carruagem para lhe dar igual tratamento.
Segundo a sua auto-biografia, Darwin teria já em criança manifestado compaixão pelas minhocas perfuradas por um anzol, um gesto que não repetiria sem antes as matar humanamente, ainda que com prejuízo na eficácia da pescaria (nada nos diz sobre a compaixão pelo peixe). Recorda ainda nos seus escritos ter também em criança voluntariamente maltratado um pequeno cão, pela breve sensação de poder que isso lhe dava, mas não sem que se arrependesse amargamente e para o resto da vida desse episódio. Referia-se frequentemente aos seus cães nas cartas à família, como se de familiares se tratassem, e sobre esta espécie afirmou: “Besides love and sympathy, animals exhibit other qualities connected with the social instincts, which in us would be called moral; and I agree with Agassiz that dogs possess something very like a conscience”
Publicamente reconhecido como um defensor dos animais, tinha ainda uma relação cordial com a conhecida activista anti-vivissecção Frances Power Cobbe, com a qual não só vizinhava durante o Verão, como partilhava interesses comuns, nomeadamente o amor pelos cães. Assim sendo, e tendo rebentado em 1875 a contestação contra o uso de cães em estudos científicos, não tardaria a que esta lhe propusesse assinar a sua petição para intensa regulamentação (e, preferencialmente, a abolição) desta prática. Curiosamente, não só Darwin recusou, como incaracteristicamente tomou parte activa na questão, nomeadamente numa proposta alternativa de legislação para a regulamentação da vivissecção (termo que aliás não gostava, pois englobava quer experiências dolorosas, quer aquelas conduzidas com animais anestesiados).
Que conclusões tirar desta atitude, aparentemente contraditória à sua natureza? As suas cartas dão-nos alguma informação a esse respeito.
Em carta a Ray Lankester (22 de Março de 1871), Darwin afirmou que:
“You ask about my opinion on vivisection. I quite agree that it is justifiable for real investigations on physiology; but not for mere damnable and detestable curiosity. It is a subject which makes me sick with horror, so I will not say another word about it, else I shall not sleep to-night.”

Outro extracto das notas de Sir Thomas Farrer evidenciam como Darwin expressava vivamente essa posição também nas suas conversas:



“The last time I had any conversation with him was at my house in Bryanston Square, just before one of his last seizures. He was then deeply interested in the vivisection question; and what he said made a deep impression on me. He was a man eminently fond of animals and tender to them; he would not knowingly have inflicted pain on a living creature; but he entertained the strongest opinion that to prohibit experiments on living animals, would be to put a stop to the knowledge of and the remedies for pain and disease.”

Daqui se depreende que, tal como muitos de nós, Darwin achava a experimentação animal justificável, dependendo do propósito. Quando este era o avanço do conhecimento da fisiologia, com o intuito de aliviar a dor e sofrimento humanos, Darwin admitia que a experimentação animal era da maior importância, ainda que as experiências muitas vezes conduzidas, em concreto, o fizessem empalidecer.
Ainda sobre as ideias de Darwin, transcrevo aqui algumas frases-chave de uma carta (de 4 de Janeiro de 1875) que enviou à sua filha, a propósito da vivissecção, e na qual me parecem estar alguns pontos essenciais que permitem rebater sem sombra de dúvida a alegação de alguns movimentos activistas pró-animal de que Charles Darwin seria anti-vivissectionista.
I have long thought physiology one of the greatest of sciences, sure sooner, or more probably later, greatly to benefit mankind; but, judging from all other sciences, the benefits will accrue only indirectly in the search for abstract truth.”
Esta é uma verdade ainda nos dias de hoje. Contudo, ainda que os benefícios que advém do conhecimento adquirido pela experimentação animal nem sempre sejam imediatos (ou mesmo os esperados inicialmente), Darwin não via este ponto como essencial ao debate.
It is certain that physiology can progress only by experiments on living animals.”
(Isto já não é tão verdadeiro nos dias de hoje – e o desenvolvimento de alternativas ao uso de animais tem vindo a aumentar – mas era-o, sem dúvida, naquele tempo)
Therefore the proposal to limit research to points of which we can now see the bearings in regard to health, etc., I look at as puerile.”
E aqui temos a razão pela qual Darwin se opôs a assinar a petição de Ms. Cobbe.
I would gladly punish severely any one who operated on an animal not rendered insensible, if the experiment made this possible; but here again I do not see that a magistrate or jury could possibly determine such a point.”
Uma vez mais surge uma questão ainda hoje pertinente. Como demonstrar que há ou não alternativas, ou lugar para a aplicação dos 3Rs, num dado protocolo experimental que contemple o uso de animais?
Therefore I conclude, if (as is likely) some experiments have been tried

too often, or anaesthetics have not been used when they could have been,

the cure must be in the improvement of humanitarian feelings.”
É surpreendente que Darwin tenha feito esta afirmação 84 anos antes da publicação do famoso Principles of Humane Experimental Technique, de Russel e Burch.
Em jeito de remate, a propósito da referida petição:
I cannot at present see my way to sign any petition, without hearing what physiologists thought would be its effect, and then judging for myself. I certainly could not sign the paper sent me by Miss Cobbe, with its monstrous (as it seems to me) attack on Virchow for experimenting on the Trichinae. I am tired and so no more.”

Para esquerda ou para a direita?

Pode ser que somos a única espécie de animal politico, mas não somos os únicos com tendências para direita ou para a esquerda – no que diz respeito a preferência física de uma pata sobre a outra ou um lado sobre o outro. Quando no laboratório treinamos um ratinho de executar uma tarefa com lateralidade, precisamos primeiro determinar se este ratinho tem uma preferência natural. Neste caso, para ter a certeza que estamos a medir a aprendizagem da tarefa em questão, escolhemos treina-lo a executa-la no lado contrário ao preferido. Mas lateralidade no mundo animal é mais do que ser canhoto ou não – saiba mais na ultima edição da New Scientist.

A mesma revista conta também a noticia da observação do comportamento de chimpanzés fêmeas depois da morte do bebé, e como estas resistem em se separar da cria mesmo evidentemente morta. A observação de um grupo de chimpanzés no distrito de Bossou em Guiné feita por uma equipa incluindo a investigadora portuguesa Cláudia Sousa da Universidade Nova de Lisboa, foi originalmente publicada na revista Current Biology.