The Cycle of Life and Death

Fiel às minhas origens, como ovos, arenque e salmão na Páscoa, e a minha intenção para o Animalogos desta Páscoa era um post sobre rotulação de ovos (de galinha). Mas entretanto encontrei este trabalho de uma famosa actriz, filha de mãe sueca, que além de ser a mulher mais bonita do mundo revela agora a sua genialidade na comunicação humorística e artística de biologia. Então ficaremos pelo salmão.

Vida, morte e ressurreição – que tema mais adequado para estes dias?

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Produzir bem é estar bem… ou não?

A maioria dos cientistas em bem-estar animal diria que a produção não é um parâmetro fidedigno para se aferir o bem-estar. Mas muitos agricultores e engenheiros zootécnicos diriam, por outro lado, que um animal que produz bem é também um animal que está bem. Em geral, é verdade que um animal acometido pela doença não será o mais produtivo mas, para além deste facto, a relação entre produtividade e bem-estar está longe de ser linear. Isto fica claramente ilustrado num interessante e importante estudo que relaciona a saúde podal de vacas leiteiras e a produtividade, publicado na revista Animal Welfare 04/2010.

Uma equipa conjunta da Universidade Austral de Chile e da Warwick University no Reino Unido treinou produtores de gado leiteiro a usar um sistema padronizado de detecção de laminites (inflamações do casco que provocam claudicação) e a identificar a patologia podal por detrás da claudicação. Sempre que uma vaca manca era identificada, ela era tratada para o problema específico. Sete explorações e 1.635 vacas foram incluídas no estudo. No final, correlacionaram-se os dados sobre a saúde podal com os dados sobre a produção de leite de cada vaca.

 
Para todas as causas de claudicação, a produção de leite aumentou no mês após o tratamento. Para algumas das anteriores houve também uma redução significativa na produção durante alguns meses antes do tratamento, como ilustra o diagrama (que pode ser visto em formato maior clicando sobre a figura).

Mas para uma das patologias podais, dupla sola, as vacas que foram diagnosticadas com o problema apresentaram maior produção de leite antes da sintomatologia do que as vacas sem claudicações. E para outra patologia, a dermatite digital, as vacas coxas produziram mais leite – mesmo sofrendo da doença não tratada – do que aquelas que não apresentaram claudicações.
 
O que é que isto nos diz? Em primeiro lugar – e este é provavelmente o achado mais importante do estudo – que vale a pena aos agricultores estar atentos às vacas coxas e tratá-las atempadamente já que, em geral, a produção diminui quando a vaca claudica e volta a aumentar após o tratamento. Em segundo lugar, que seria benéfico tanto para os agricultores como para as vacas se os problemas fossem detectados mais cedo. As vacas foram tratadas logo que o problema foi detectado, mas, como mostra a figura, a produção já vinha diminuindo durante os meses anteriores, sugerindo que os animais poderiam ter problemas podais muito antes de estes serem detectados. Em terceiro lugar, que a relação entre produção e saúde / bem-estar é complexa. Ao nível individual, a produção parece, de facto, reflectir a saúde: à medida que uma vaca desenvolvia patologias nos seus cascos, a produção de leite descia. Mas ao nível colectivo esta relação não é clara. Por um lado, as vacas de alto rendimento parecem estar em maior risco de desenvolver patologias podais (como já havia sido determinado noutros estudos). Por outro lado, vacas com dermatite digital mantiveram-se mais produtivas do que as vacas não coxas mesmo quando a patologia não estava ainda a ser tratada.
Assim, quando o agricultor observa que uma vaca diminui inesperadamente a produção de um mês para o outro, há todas as razões para suspeitar que a sua saúde e bem-estar estão afectados. Mas o facto de uma vaca produzir mais do que a média não pode ser usado como prova de que ela é saudável e de que goza de bem-estar.Listen
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Direito animal

Direito animal , ou “Animal law”, é o ramo de direito que se preocupa com o estatuto legal dos animais e a prática legal em casos envolvendo animais. É praticamente inexistente em Portugal e não tem grande expressão nas faculdades de direito europeias mas está em forte crescimento nos EUA: Tanto que a revista Science dedica um News Focus ao assunto.

As recently as 2000, only a handful of law schools in the United States offered courses in animal law. Now roughly 120 do. These include several of the nation’s premier law schools, including
Harvard, Stanford, and Columbia.

Este movimento nasceu em resposta a actual situação legal nos EUA onde – diferente do que no cenário europeu – poucos animais estão legalmente protegidos.

many [who teach and study animal law] take issue with a legal system that treats animals as property and provides few mechanisms for protecting their interests in court.

O que está a acontecer legalmente tem paralelos com o que conhecemos da Europa no sentido de introdução de regras para o alojamento e tratamento de animais de produção. Neste ambito, alguns estados aproximam-se da legislação da União Europeia.

In 2008, for example, California voters approved a ballot measure that will outlaw cages that restrict the movement of egg-laying hens, calves raised for veal, and pregnant sows

E o estatuto legal dos outros animais não é uma precupação unicamente da Europa e America do Norte.

From Science Magazine 1 April 2011

Mas há caracteristicas particulares do movimento actual que refletam as diferenças politicas e legais entre EUA e Europa. Há noutro lado do Atlantico um maior enfase nos direitos individuais, mesmo quando o individuo é peludo ou tem asas ou barbatanas. David Favre do Michigan State University College of Law defende que os animais devem “have the right to sue”, ter o direito de levar (ou ter alguem a levar) o seu caso a tribunal. E um outro dos juristas notáveis da area, Steven Wise, está a juntar evidências para testar o sistema.

Getting a judge or jury to consider these arguments is the goal of NHRP [Nonhuman Rights Project] Since 2007, Wise has recruited more than 50 volunteers, including lawyers and sociologists, who are working to identify potential plaintiffs and determine which jurisdictions are most likely to be sympathetic to their arguments and which legal strategies are most likely to be effective. He estimates that they’ve spent a cumulative 20,000 hours analyzing dozens of legal and sociological issues in all 50 states.

The first case will likely involve an animal being held in substandard conditions: perhaps a dolphin kept in a small pool at an aquarium or a chimpanzee confi ned to a small cage at a zoo or research facility. NHRP will file a lawsuit in trial court, probably using habeas corpus or another
common law writ, de homine replegiando, used centuries ago in slavery cases.

If the trial court dismisses the case, Wise says he will appeal all the way to the state’s highest court.

Dado que os EUA aplica case law (jurisprudencia, ou seja uma decisão particular de um tribunal pode mudar a maneira como a lei é interpretada em geral), um caso de sucesso do Wise poderá ter consequências vastas. Neste sentido, o movimento parece mais confrontacional do que a visão europeia em que o desenvolviemnto da legislação expande a protecção dos animais sem lhes conferir direitos. A protecção dos animais contra sofrimento parece mais compatível com um uso humano dos outros animais do que a defesa dos direitos dos animais.

De novo a China – "Porta-chaves" com peixes e tartarugas

Interrogo-me porque aparece tantas vezes a China como um país onde não se tem em consideração o sofrimento animal.
Evidentemente, esta descrição não corresponde à posição de todos os chineses perante os animais, mas a verdade é que a China continua a ser um grande consumidor de carne de golfinho, chifres de rinoceronte, barbatanas de tubarão, bilis de urso, etc., com consequências desastrosas para o bem-estar animal e a conservação das espécies.
Crédito da foto: Li Bo
 (“Global Times“)
Agora, parece que o novo “negócio da China” é a comercialização de “porta-chaves” de plástico transparente e selado, onde são colocados pequenos peixes ou tartarugas, que eventualmente morrem asfixiados. Indiferentes a isso, os compradores destes “acessórios” simplesmente cozinham no microondas os cadáveres e consomem-nos. De salientar que esta prática não infringe lei alguma, sendo os “animais embalados” vendidos em plena praça pública, à luz do dia, sendo comprados frequentemente por chineses que o fazem para os poderem libertar de seguida. Esta atitude, ainda que bem-intencionada, poderá levar a problemas ecológicos e/ou de saúde pública, caso esta “moda” esteja para ficar.
Como nota de rodapé, deixo a  notícia do Global Times de Novembro do ano passado, que divulgava a existência de grupos secretos na China que pagam a  mulheres para maltratar animais até à morte e que filmam esta prática, colocando os vídeos on-line, como forma de satisfazer um mórbido fetiche.
Olhando para tudo isto, apetece perguntar:  “What`s wrong with China?”

Universidade do Porto estabelece link com UFAW

A partir de Março de 2011, alunos e professores da Universidade do Porto podem beneficiar da recentemente estabelecida ligação entre a UP e Universities Federation for Animal Welfare. Esta associação inglêsa tem como objectivo promover a questão de bem-estar animal no ambiente universitário, e recentemente abriu a possibilidade para instituições fora de Reino Unido se associar atraves do UFAW University Links.

Os pontos de contacto na UP são Paulo Vaz-Pires (ICBAS) e Anna Olsson (IBMC). As actividades a ser desenvolvidas no ambito da ligação serão abertas a toda a Universidade e teremos muito gosto em colaborar e discutir opções de actividades de divulgação. Para já, podemos adiantar que este acordo abre pela primeira vez acesso para alunos portugueses a um programa de bolsas especificamente destinados a trabalhos em bem-estar animal. Embora o concurso para 2011 fechou antes do estabelecimento do acordo, esperamos já ver alunos da UP a concorrer em 2012!

O pastor ausente

A convivência entre humanos e animais não se limita às situações em que os animais estão em cativeiro, acontece também no contacto com os animais selvagens ou assilvestrados. Um artigo do Público de sexta-feira dia 18 de Março, infelizmente não acessível on-line, relata a preocupação dos agricultores em Paredes de Coura com o impacto dos cavalos garranos. Mais do que preocupar-se, a Vessadas, Associação para o Desenvolvimento Agrícola e Rural das Terras de Coura está a processar o Estado por não controlar os garranos. Afirma-se que o problema tem a ver com o ‘pastor ausente’: “um novo tipo de pastoreio que surgiu nas últimas duas décadas. Passou a existir um novo tipo de ’criador’ de gado, que não é agricultor. Não exerce qualquer actividade produtiva que possa suportar os animais, nem possui qualquer estrutura de curral que permita conter os animais. O ‘pastoreio’ consiste numa visita semanal ou quinzenal à zona onde se abandonaram os animais, normalmente realizada em viatura todo o terreno ou mota.”
Não conheço o fenómeno além do que leio no jornal, não posso confirmar se a descrição da situação é verosímil. Mas a leitura leva-me a pensar num outro encontro entre espécies diferentes, o Homo sapiens rural e o Homo sapiens urbano. Criada num meio agrícola, vivendo agora na cidade, penso que sou uma híbrida entre as duas, o que me faz reflectir bastante sobre o seu difícil encontro. Muito do trabalho de conservação, em Portugal e não só, é caracterizado por uma tensão entre as preocupações da população local que convive com as especies a ser protegidas e as preocupações de conservação que na maior parte das vezes vêm de fora. Isto é muito evidente no caso do lobo na zona de Douro e Trás-os-Montes, um caso que espero poder explorar mais ao longo dos próximos tempos cá no animalogos.
Não sei de onde vem o pastor ausente ou onde mora, mas tudo indica que não é lá, na terra onde vivem os seus animais e onde vivem outros agricultores. Esta constatação incomoda. O garrano não tem uma vida fácil. O agricultor de pequena escala do Norte de Portugal também não. A última coisa que precisam são intervenções de origem urbana que agudizam a confrontação.

Knut, um simbolo da conservação ou da opressão?

Poucas serão as pessoas ligadas à conservação animal que nunca ouviram falar de Knut. O primeiro urso-polar a nascer no Zoo do Berlim em mais do que 30 anos, Knut foi rejeitado pela mãe e adoptado por biólogos do zoo que conseguiram criá-lo em ambiente artificial e em contacto com seres humanos. Na altura da sua adopção colocou-se o dilema: seria melhor eutanasiar Knut para que ele não viesse a sofrer ou, pelo contrário, adoptá-lo e através disso sensibilizar o público para perigo de extinção do uros polar? E aqui colidem duas formas muito diferentes de entender a ética animal: por um lado temos a visão de que o bem-estar individual se sobrepõe aos interesses da espécie e por outro temos um indivíduo instrumentalizado para, de alguma forma, beneficiar a espécie que ele representa. As pessoas responsáveis por Knut optaram pela segunda via. Knuk morreu em idade precoce e exibindo sinais evidentes de disfunção comportamental mas será que os fundos que ele gerou e a atenção mediática que despertou suplantam o seu sacrifício?

2011 – Ano Mundial da Medicina Veterinária


Por ocasião da fundação da primeira faculdade de medicina veterinária em 1761 em Lyon, França, comemora-se este ano o Ano Mundial da Medicina Veterinária. São 250 anos de história de uma profissão que significa muito mais do que apenas ser médico de animais. A OIE (World Organization for Animal Health) criou uma série de pequenos vídeos que evidenciam o importante papel que o Médico Veterinário desempenha na sociedade, em todas as suas áreas de intervenção, desde a Saúde e Bem-estar Animal à Saúde Pública e Segurança Alimentar.

Pig Business – O Filme


Os filmes em formato de documentário têm-se tornado cada vez mais um veículo previlegiado pelos grupos activistas para denunciar sistemas de produção animal intensivos e globalizantes. “Pig Business” (Director: Tracy Worcester, UK, 2009) é um produto desta estratégia que denuncia os investimentos feitos pela empresa norte-americana Smithfield na Polónia de forma a conquistar o mercado europeu de carne de porco. O filme – com legendagem de português do Brasil – está disponível na íntegra no You Tube.

Sem querer de forma alguma desvalorizar a relevância do tema, penso que a narrativa é por vezes demasiado linear e parece deixar de fora aspectos importantes na compreensão da dinâmica global de alimentos de origem animal. O filme recorre, em especial, à vox populi como forma de legitimar a demonização de todas as empresas de suinicultura que, de alguma forma, procuram o lucro, enjaulam animais, poluem o ambiente, propagam doenças, violam directivas europeias e esmagam os pequenos produtores. Da mesma forma, quando a realizadora quis mostrar um exemplo do pequeno produtor (30:05), não foi capaz de escapar ao esteriotipo da exploração familiar que vive em harmonia com a natureza a criar meia dúzia de animais e cuja triste condição se deve tão somente à incapacidade em competir com os preços praticados pelas grandes indústrias. Aí o filme parece atirar sobre todas as formas de globalização de forma indiscriminada, o que lhe rouba credibilidade sem acrescentar substância. A entrevista com um responsável da Smithfield (43:18) – que deveria ser um ponto alto da investigação da autora – cai no ridículo quando ela começa por comparar as fezes de 10 milhões de porcos com as de 100 milhões de pessoas.

Interessante foi a exibição de imagens de jaulas de reprodutoras numa suinicultura intensiva portuguesa (49:20) e que inaugura a questão do bem-estar animal, que ainda assim merece um tratamento superficial (qual a diferença das etiquetas “freedom food“, “free range“, “organic” ou “outdoor“? Podemos – ou devemos – colocá-las a todas dentro do mesmo saco?). Só no final (53:45), a autora procura contextualizar a política alimentar europeia mas limita-se a fazer uma entrevista de rua a um parlamentar anti-sistema sem a equilibrar com uma voz de dentro do sistema europeu que, mal ou bem, dita as regras.

Qual a sua opinião sobre este filme? E sobre a suinicultura intensiva?