A suinicultura e o ambiente – Seminário 19/11

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A FPAS – Federação Portuguesa de Associações de Suinicultores junto com a Embaixada do Reino dos Países Baixos vai organizar no próximo dia 19 de Novembro um seminário sobre A Suinicultura e o Ambiente.

Conta com intervenções das setores de política, investigação e produção tanto de Portugal como dos Países Baixos.Público-alvo será suinicultores, responsáveis pela área do ambiente das empresas suinícolas, organizações de produtores agrícolas, técnicos da administração pública, e entidades de ension superior agrícola e ambiental.

Inscrições até 8 de Novembro para fpas@suinicultura.com.

Vai participar no evento, e quer ajudar o animalogos com um relato? Por favor deixe aqui um comentário (com o seu e-mail indicado na caixa para o efeito), ou contacte-nos diretamente por e-mail.

O (ig)nobre estudo do comportamento bovino

De 40 em 40 anos, a disciplina de etologia é reconhecida com um grande prémio internacional: em 1973 foi o Nobel para Konrad Lorenz, Niko Tinbergen e Karl von Frisch para “as suas descobertas acerca de organização e elicitação de padrões individuais e sociais de comportamento” e em 2013 o IgNobel para Bert Tolkamp, Marie Haskell, Fritha Langford, David Roberts e Colin Morgan. Enquanto o primeiro premio foi para trabalhos com animais selvagens, e a considerar como investigação fundamental, o segundo premio representa a aplicação de estudos de comportamento à investigação em bem-estar animal. E embora pode inicialmente parecer um premio de valor discutível, os prémios IgNobel não são atribuídos a investigação ridícula, mas “para descobertas que primeiro faz rir, depois faz pensar”.

http://youtube.googleapis.com/v/4VG67U2D-gs&source=udsO trabalho de Tolkamp e colaboradores foi publicado em Applied Animal Behaviour Science em 2010. A equipa aplicou pedómetros a vacas em três estudos separados (vacas de carne em estabulação livre com cama de palha, vacas de carne em pastagem e vacas leiteiras em estabulação livre com cubículos). O objetivo foi de, por um lado, testar a possibilidade de usar este equipamento para medir aquando as vacas se deitaram e levantaram, e por outro lado, testar dois hipóteses: 1) quanto mais tempo uma vaca tem passado deitada, mais provável é que ela se vai levantar e 2) quanto mais tempo uma vaca tem passado em pé, mais provável é que ela se vai deitar.

O resultado? E relatado a partir de 1:10 no vídeo, onde Bert Tolkamp ainda confirma o que eu própria sempre suspeitei sobre o estudo de comportamento de vacas.

Bem-estar Animal: onde a filosofia moral e a ciência se cruzam

De Benice Bovenkerk, Ethics Institute da Universidade de Utrecht

Deixamos aqui tradução de um artigo de Bernice Bovenkerk onde se apela a uma maior colaboração entre cientistas e filósofos eticistas para o desenvolvimento da nossa concepção de bem-estar animal e o melhoramento das nossas práticas neste domínio.

O artigo original foi publicado na Newsletter da Eursafe de Julho de 2013, e será em breve disponibilizado online aqui.
Arte de Lowell Herrero. Fonte.
Minding Animals

Muitos membros do EurSafe lidam, de uma maneira ou de outra, com o bem-estar de animais de produção. Numa altura em que nos questionamos sobre como implementar padrões de bem-estar, é importante que estejamos  conscientes de que fazemos todo o tipo de suposições, quer do ponto de vista moral, quer científico. 

A implementação de bem-estar animal é o culminar de toda uma linha de pensamento na qual ética e ciência interagem e que assenta no pressuposto que os animais possuem estatuto moral. Noutras palavras, querer implementar padrões de bem-estar frequentemente implica que os animais sejam parte de uma comunidade moral, ou que os seus interesses tenham peso nas nossas decisões morais. 

Passo a ilustrar sucintamente esta linha de raciocínio a partir do exemplo do bem-estar animal em peixes. O bem-estar dos peixes pode ser promovido de várias maneiras: podemos, por exemplo, matar os peixes de um modo mais ‘humano’, ou melhorar a qualidade da água. Poderá acontecer não dispormos dos recursos necessários para implementar ambas as medidas, pelo que teremos que tomar uma decisão que, em parte, é uma decisão moral. Promover o bem-estar em peixes também pressupõe que este deva ser ponderado com outros valores, como a saúde pública e a higiene.  Para que possamos melhorar o bem-estar animal de peixes será melhor que os matemos no viveiro, mas isto levanta questões de saúde pública. Fazer estas escolhas, no entanto, já pressupõe que saibamos o que significa para o animal ‘estar bem’, que sabemos definir bem-estar com base nesse conhecimento e que sabemos como o medir. 

O termo “bem-estar” é um termo avaliativo, que combina regras morais e resultados científicos. Nos métodos usados para avaliar o bem-estar são também feitas muitas suposições avaliativas. Em que parâmetros deverão estas medições assentar? Saúde, crescimento, reprodução, frustração, medo, capacidade para expressar comportamentos naturais? E dever-nos-emos focar somente em variáveis objectivas e mensuráveis – como níveis de cortisol – ou devemos incluir métodos qualitativos? Em todos estes passos na decisão toma lugar uma interacção em ciência e moral. Todos estes passos também assumem a priori que o bem-estar é importante e isto levanta a questão do “porquê”. Para algumas teorias morais o bem-estar é de maior relevo que para outras. As teorias que dão um lugar central ao bem-estar  pressupõem que os animais detêm o tipo de capacidades que os habilitam a estar, ou não, bem. A senciência – a capacidade para sentir – é a tipicamente mais mencionada, mas capacidades cognitivas mais complexas poderão ser também relevantes. Que capacidades são tidas como moralmente relevantes irá depender da matriz normativa teórica de cada um. Em resumo, os eticistas não conseguem dar respostas acerca do estatuto moral dos animais e o seu bem-estar sem a contribuição da ciência sobre, entre outras coisas, as capacidades dos animais. Mas também não podem os cientistas dar resposta a questões sobre a avaliação e promoção do bem-estar sem a contribuição da ética. 

Vamos então debruçar-nos sobre que capacidades animais são relevantes segundo a perspectiva de uma série de diferentes abordagens ou teorias morais e sobre o tipo de questões que emergem de cada uma destas diferentes teorias. Correndo o risco de caricaturizar cada uma destas diferentes abordagens ou teorias, vou sumariar o essencial sobre cada uma delas e salientar as implicações de cada uma para o animal. 

(I) Os utilitaristas argumentam que, se um animal é senciente, então deverá ter a capacidade de sentir dor e prazer, pelo que terá interesses. A senciência é assim condição necessária e suficiente para outorgar estatuto moral. De acordo com alguns utilitaristas, como Peter Singer, nas nossas decisões morais deveremos ponderar os interesses de cada indivíduo equitativamente. Ademais, ele advoga que quando os animais têm uma consciência de si, terão um interesse em não serem mortos. As questões relativas às capacidades dos animais serão então: Podem os animais experienciar dor? Que outro tipo de experiências poderão ser causa de mal- estar (frustração, tédio)? Que experiências positivas poderão os animais ter? Deverão as experiências positivas ser sempre definidas como necessárias à sobrevivência, ou são supérfluas? Os animais brincam? Que animais têm preferências? Quais os animais que têm consciência de si mesmos? 

(II) De acordo com os deontologistas, a senciência é condição sine qua non para ter estatuto moral, mas não é suficiente. A detenção de capacidades cognitivas mais complexas é também necessária. Um animal tem assim interesses apenas quando pode experienciar a sua vida subjectivamente e tem algum tipo de autonomia – como a autonomia de preferência –  ou se tem uma identidade psicossocial ou unidade através do tempo. Questões relevantes, para além das que os utilitaristas colocam são: Que animais têm desejos, crenças e intenções? Haverá espécies que agem com base de algum tipo de raciocínio, ao invés de uma mera tendência para determinados comportamentos? A aptidão para a aprendizagem implica para o animal ser ‘sujeito de si’? Podem algumas espécies ter as capacidades necessárias ao comportamento moral? O que pode significar ‘ter autonomia’ para um animal?

(III) De acordo com a ética relacional, o nosso compromisso para com os animais é determinado pela relação que com eles estabelecemos, bem como pela sua vulnerabilidade e dependência dos humanos. A principal questão aqui não é portanto se os animais têm ou não estatuto moral, mas antes como devemos tratar alguns animais em específico, animais esses que se tornam foco da nossa atenção em virtude da relação que estabelecemos com eles. Assim, temos diferentes obrigações para com animais domésticos, por exemplo, porque assumimos o compromisso para com eles ao trazê-los para a nossa esfera de influência. Questões relevantes são: Podem os animais comunicar e interagir, dentro da sua espécie e com outras? Podem estabelecer relações com os humanos? Pode a compreensão de linguagem simbólica por parte dos animais ter algum peso nesta questão?

(IV) De acordo com a abordagem das capacidades, como proposta por Martha Nussbaum, os animais são agentes que procuram existir e prosperar. Temos assim o dever de permitir que vivam e alcancem todo o seu potencial, incluindo sentimentos como o amor ou o pesar. Isto implica, entre outras coisas, que os animais sociais precisam de viver no seu meio social para que possam prosperar. Questões relevantes aqui são: Quão cognitiva e socialmente complexas são as diferentes espécies animais? O pressuposto parece ser que quanto mais cognitivamente complexo um animal é, mais intricada é a sua capacidade para prosperar. Isto também implica que a capacidade para a aprendizagem cognitiva de animais em zoos e em instalações agro-pecuárias poderá requerer um enriquecimento ambiental que constitua um maior desafio para estes animais. 

V) As abordagens até aqui referidas têm considerado apenas como relevantes as capacidades de cada animal, como indivíduo. No entanto, ao nível do grupo poderão emergir capacidades que transcendem as manifestadas por cada animal individualmente. Colectivamente, os animais tomam decisões que transcendem as suas limitações cognitivas. Assim, por exemplo, se pensarmos num bando de aves, um enxame de insectos ou um cardume de peixes, estes têm uma amplitude sensorial muito maior que a de cada animal individualmente, permitindo-lhes dar uma melhor resposta a uma dada ameaça ou a um predador. Podemos também considerar as térmitas, que em conjunto conseguem construir estruturas que obedecem a princípios matemáticos. Questões relevantes que se nos apresentam são: Haverá algo como uma cognição colectiva? Se sim, o que é que isto pode significar para a atribuição de estatuto moral? Podemos afirmar que os indivíduos nestes grupos não têm necessariamente interesses e estatuto moral, mas o colectivo sim? Devo salientar, já agora, que esta abordagem ao nível do grupo difere de uma perspectiva ecocêntrica, na qual é atribuído estatuto moral a cada espécie. Nas teorias ecocêntricas, isto não tem por base a capacidade cognitiva. 

Em suma, diferentes teorias levantam diferentes questões relativamente às capacidades dos animais, mas em todas as teorias aqui abordadas é necessária uma interacção entre cientistas e eticistas. Um problema inicial é determinar se os cientistas empíricos podem de facto interpretar e abordar estas considerações de um modo científico. O que é que termos como intenções, crenças, consciência ou dor significam para as diferentes disciplinas? Depois, cientistas e eticistas precisam de desenvolver os métodos para testar a presenças destas capacidades. Uma questão importante é determinar que dados seriam suficientes para nos convencer que os animais detêm estas capacidades. Estas questões carecem das contribuições de um outro ramo da filosofia, nomeadamente o da filosofia da mente, e em particular a cognição comparada. Recentemente podemos de facto encontrar cada vez mais interacções interdisciplinares deste tipo, e espero que esta newsletter seja caso disso. 

*O meu agradecimento a Clemens Driessen por comentários a este texto.

– Bernice Bovenkerk
Traduzido por Nuno Franco

O funcionamento das inspecções de Bem-estar Animal na Dinamarca – entrevista a Inger Anneberg

Anna Olsson – Olá Inger Anneberg, Universidade de Aarhus, Dinamarca. Parabéns pelo recentemente concluido doutoramento e pelos artigos que dele resultaram, publicados nas revistas Animal Welfare e Livestock Science.
Neste projeto, a Inger estudou as interacções entre agricultores e inspetores de bem-estar animal durante visitas não-anunciadas a explorações dinamarquesas. Podia elucidar-nos um pouco sobre o funcionamento das inspecções de bem-estar animal na Dinamarca?
Inger Anneberg – Na Dinamarca, pelo menos 5% de todos os rebanhos ou manadas com pelo menos 10 animais (incluindo cavalos) são inspeccionados todos os anos. Estas inspecções são realizadas por médicos veterinários oficiais e técnicos das administrações regionais. A Administração Veterinária e Alimentar dinamarquesa selecciona as explorações a ser inspeccionadas, se possível, por meio de parâmetros de risco, tais como os achados de matadouro, dados de auto-controlo do bem-estar animal pelo próprio produtor, uso de antibióticos e mortalidade. As inspecções são geralmente feitas sem aviso prévio, a fim de obter a imagem mais realista das condições do gado. Em algumas explorações a pessoa responsável pode não estar disponível. Em tais casos, pode ser necessário dar aviso prévio da inspecção de 48 horas. Se o proprietário ou o seu representante não está na exploração, a inspecção não é realizada.
Na prática, o inspector apresenta-se e explica a finalidade e âmbito da inspecção. O proprietário ou o seu representante também serão informados sobre a base jurídica da inspecção. Em seguida, o inspector vistoria todo o rebanho ou manada para avaliar se o produtor está em conformidade com as normas de protecção dos animais. No final da inspecção o produtor receberá um documento de verificação como prova de que o controlo foi efectuado. A inspecção pode mostrar que tudo está em ordem. No entanto, se qualquer disposição tiver sido violada, a autoridade de inspecção tem várias opções à sua disposição, dependendo da natureza e gravidade da infracção. O inspector pode emitir avisos para delitos menores ou autos de execução se for considerado que os animais foram sujeitos a tratamento negligente. Casos de negligência grosseira são reportados à polícia. Tanto os regulamentos nacionais como os da UE são inspecionados e, como tal, a retirada de subsídio da UE também pode ser o resultado da infracção.

A.O. – Qual a opinião dos produtores sobre as inspecções?

I.A. – A minha tese de doutoramento mostra que os produtores por um lado consideraram a inspecção do bem-estar animal como necessária e inevitável (principalmente com base na crença de que nem todos os produtores cumprem a lei) mas, por outro, sentiram que as inspecções eram geralmente injustas. Os participantes no estudo sentiram que a injustiça tinha a ver com o facto dos inspectores não usarem os mesmos padrões de referência para o julgamento das explorações. Além disso, os produtores queriam mais espaço para discussão e interpretação durante as visitas. Assim, em algumas situações, os produtores mencionaram a expectativa de encontrar um sistema de controlo objectivo e de forma a se poder entender e concordar com as suas regras e normas. A injustiça também tinha a ver com o facto de as inspecções serem realizadas sem aviso prévio e, portanto, muitas vezes sentidas como uma perturbação à vida quotidiana. Além disso, o sentimento de injustiça dos produtores prendia-se com o facto de não ser capaz de cumprir as exigências das autoridades e com o facto dos condicionalismos da UE virem a ser muito caros para o produtor. Por fim, os produtores expressaram a opinião de que as inspecções foram realizadas de maneiras muito diferentes entre explorações. Portanto, eles acreditam que a inspecção, apesar de proteger o sector, gera um sentimento de incerteza.

A.O. – O que é que os inspectores de bem-estar animal dizem sobre as suas funções e responsabilidade?

I.A. – Os inspectores de bem-estar animal expressam um dilema ligado à aplicação da legislação. Por um lado a pesquisa revelou uma visão de que os controladores só devem verificar se os produtores estão ou não conformes com a regulamentação de bem-estar animal. A questão chave deste tema é a regra legal de que todos os infractores devem ser tratados por igual. Por outro lado identificou-se um tema em que um elemento importante das inspecções é o de entrar em diálogo com os produtores. Este tema pode ser baseado numa visão mais progressista que visa motivar os produtores a cuidar do bem-estar dos animais sob o seu cuidado. A pesquisa mostra que este dilema leva a estratégias individuais por parte dos inspectores. O modo como as inspecções são realizadas na prática é influenciado pelas estratégias individuais desenvolvidas pelos inspectores independentemente das directrizes formuladas ao nível administrativo
Um tema em que todos os inspectores concordaram foi a importância de usar o diálogo como uma ferramenta antes e enquanto se examina o cumprimento / incumprimento. Inclui-se nesta ferramenta o uso de elogios, dizendo ao produtor quando algo parece bem, motivando-o a falar e a evitar discussões. No entanto, a ferramenta de diálogo por parte do inspector nem sempre foi encarada pelos produtores como sendo “diálogo”. Os inspectores também concordaram que demasiadas regras e a conformidade cruzada com as regras da EU torna as inspecções complicadas e com maior risco de conflito com os produtores.
O dilema entre inspectores mostra que a comunicação com os produtores sobre a legislação de bem-estar animal e, por exemplo, o que está por trás desses regulamentos é realizada de maneiras muito diferentes. Alguns inspectores focaram o aspecto preventivo, querendo mudar a perspectiva do produtor e falar-lhe sobre o comportamento do animal individual. Outros inspectores queriam focar a questão do cumprimento / incumprimento e não queriam abordar a razão por trás dos regulamentos, pois isso era visto como um potencial gerador de conflitos e por forma a evitar ‘dar palestras’ ao produtor.

Traduzido por Manuel Sant’Ana segundo a anterior ortografia.

Parisienses ovinas

Quando levanto o olhar da minha secretária de trabalho, vejo as arvores do jardim do Circúlo Universitário da Universidade do Porto. O que não é nada desagradável, mas para uma animalogante não se compara com as ovelhas que pastam no jardim dos arquivos municipais de Paris. São para já quatro ovelhas cuja função é de manter os relvados cuidados sem recurso a maquinas.

A semana passada lançou-se a primeira pedra do edifício do I3S onde se vai integrar o que é agora IBMC_INEB e onde tenho o meu lugar de trabalho. Estou com vontade de animar as discussões sobre a estrategia científica com a pergunta se podemos ter um burro no quintal.

Brincadeiras à parte, a iniciativa faz todo o sentido num programa de ambições verdes. Quem quer um cortador de relva barulhente e a cheirar de gasolina quando se pode ter uma ovelha?

O consumo excessivo – Samsara


La surconsommation (o consumo excessivo), assim se chama o pungente vídeo que circula na internet. Trata-se de um excerto do documentário Samsara de 2011 (realizado por Ron Fricke), uma experiência visual  absolutamente assombrosa sobre as assimetrias do nosso maravilhoso, e ao mesmo tempo aterrador, planeta Terra. O filme percorre os cinco continentes e demorou quase cinco anos a ser filmado.

O excerto em causa parece passar-se na China e retrata o superlativo da massificação da pecuária industrial, fazendo depois a ligação para o consumismo e a obesidade. O realizador tem o cuidado de descrever (através da imagem já que o filme não tem comentários) aspectos de três das mais importantes formas de produção pecuária: a apanha mecânica de frangos de engorda (broilers), as celas de amamentação de porcas e a ordenha mecânica em bovinos leiteiros. Um quarto aspecto, o do trabalhador humano, também não é esquecido. O traveling lento da câmara de alta definição permite-nos deter sobre pequenos pormenores e qualquer um deles merecia um comentário demorado. As imagens muitas vezes aceleradas transmitem uma sensação de urgência que, aliada à escala quase sobre-humana dos espaços, nos impele a reflectir sobre os nossos hábitos de consumo e sobre as suas consequências. Mal posso esperar por ver o filme completo. 

Pastoreio e publicidade

A associação Djurskyddet Sverige (Animal Welfare Sweden) denunciou recentemente à Agência Sueca dos Consumidores um filme de publicidade da margarina Bregott* como sendo publicidade enganosa.

O filme que está em causa chama-se Kvalitetskontroll i Bregott-fabriken (controlo de qualidade na fábrica de Bregott) e mostra um vitelo a mamar uma vaca num pasto ao ar livre. Não é este o filme denunciado, mas podia ser, pois o que está em causa também consta nele:



Segundo a legislação sueca, as vacas leiteiras devem ter acesso a pastoreio por 2 a 4 meses durante o periodo 2 de maio a 15 de outubro. No entanto, esta regra não inclui vitelos e na Suécia, à semelhança do que acontece noutros países industrializados, não é costume manter os vitelos junto com as vacas leiteiras.


Algo semelhante se passa em Portugal. A imagem acima ilustra a presente campanha de publicidade da principal empresa de setor de leite no norte do país. Sendo que o sistema predominante de produção na região implica manter as vacas permanentemente estabuladas, o que diria a DECO?

Uma sugestão, para a publicidade na imagem acima deixar de ser problematica, bastava uma simples alteração. Se as embalagens de leite não fossem da linha principal da empresa, mas da sua linha de leite produzido em modo biológico, já seria correto publicitar com as vacas no pasto. 

*Bregott é fabricada pela indústria leiteira a partir de manteiga a qual se adiciona óleo de colza e água para gerar um produto menos gordo e possível de barrar em frio. O produto existe desde 1969 e foi sempre publicitado como uma alternativa mais natural à margarina convencional.

O que há de errado em comer cavalo por vaca ?

Matadouro Romeno
Photo:Daniel Mihailescu – AFP
O escândalo da carne de cavalo que estalou no Reino Unido há duas semanas não dá sinais de abrandar. A troca, propositada, de carne de vaca por carne de cavalo em produtos transformados (hambúrgeres, lasanhas, recheios) é um problema que envolve toda a Europa e que revela as fragilidades do mercado europeu de produtos de origem animal. A carne de cavalo já foi entretanto detectada noutros países como a Alemanha ou a França, estando para já Portugal fora deste mercado negro que parece ter origem na Roménia.
Duas questões principais se colocam com esta crise: uma diz respeito à quebra do elo de confiança com consumidor, que deixa de ter razões para crer na informação que vem nos rótulos; a segunda, mais grave, prende-se com os potenciais riscos de saúde pública em comer carne cujo estado sanitário se desconhece. Um dos perigos associados ao consumo de carne de cavalo é a presença do anti-inflamatório fenilbutazona. O Ministro David Heath, da DEFRA, confirmou a presença do fármaco em 8 das 206 amostras testadas pelos seus laboratórios, mas em valores considerados residuais e que portanto não constituem um risco para a saúde pública. Mas outros riscos poderão ainda emergir.
O horror com que a presença de carne de cavalo foi encarada no Reino Unido tem razões históricas. Por um lado, este caso ameaça tornar-se o maior escândalo no sector agro-alimentar europeu desde a crise das vacas loucas  nas décadas de 80 e 90 do século passado, que também teve origem nas Ilhas Britânicas. Por outro lado, não é de desprezar o facto dos britânicos serem um povo de horse lovers. Para os britânicos o cavalo é o animal de estimação por excelência, e a sua presença tem uma importância – na paisagem e no imaginário colectivo – muito superior àquela que a maioria de nós lhe reconhece. Para muitos, portanto, comer cavalo é uma ideia aberrante, como para outros será comer cão ou outro animal de estimação.
Em Portugal não existe também o hábito de comer carne de cavalo, mas as razões parecem ser diferentes. A mim, não me faz confusão nenhuma comer um bife de cavalo mas já não concebo a ideia de comer gato por lebre. Como diz Miguel Esteves Cardoso no Fugas de hoje, “aquilo que mais nos deve horrorizar  não é a presença de carne de cavalo mas a distância insondável entre o consumidor e o animal (ou animais) cuja carne está a comer.” Como omnívoro que sou, não podia estar mais de acordo. O mesmo problema se põe, por exemplo, com o leite. Existem marcas, como a Auchan, que importam leite (a granel) de França. O produto é depois embalado em Portugal e é-lhe atribuido o selo de produto nacional. Ora nada disto é transparente. Eu não tenho nada contra o leite francês ou mesmo contra os cavalos romenos. O que eu quero é saber o que estou a comer e saber também, sem sombra de dúvidas, a origem e a forma como aqueles animais foram criados. 

“Uma só Saúde” – bom ou mau para os animais?

Por Peter Sandoe

De acordo com o conceito de Uma Só Saúde, a verdadeira razão para o trabalho do veterinário é prevenir doenças humanas, como por exemplo zoonoses transmitidas a partir de animais doentes para os seres humanos através dos alimentos. Desta forma, a medicina veterinária aproxima-se da medicina humana. Tem sido defendido que esta visão não deve levar a uma menor consideração dos animais e que, pelo contrário, está destinada a ser uma situação de mútuo benefício, onde a saúde humana é assegurada através da garantia de saúde animal e do seu bem-estar.

No entanto, isso não parece ser de todo verdade. Se o objectivo é o de proteger os seres humanos, tanto quanto possível, da exposição a doenças contagiosas, a solução mais eficaz passará frequentemente por diminuir o contacto entre os animais e as potenciais fontes de contaminação externas. A consequência para um número considerável de animais de produção será mantê-los sempre fechados. Isso é bom para a segurança alimentar, mas será ideal para o bem-estar animal?
O movimento Uma Só Saúde tem sido, até agora, focado na prevenção da transmissão de doenças de animais de produção de animais selvagens para o ser humano, mas a World Small Animal Veterinary Association uniu forças com a OIE para incluir também animais de companhia, argumentando que estes têm um efeito directo na promoção da saúde humana em situações que vão desde a educação das crianças, passando pelo auxílio na recuperação de doenças, até ao acompanhamento de idosos. Isto é, os efeitos positivos dos animais de companhia para a saúde humana também desempenham um papel na perspectiva de Uma Só Saúde. Mais uma vez, os animais estão lá, mas não em seu próprio direito. O conceito Uma Só Saúde parece ser construído na premissa de que, no final do dia, apenas a saúde humana conta. Parece-me que este é um conceito questionável para os veterinários assinarem.
Em vez disso, poder-se-ia tentar dar a volta à discussão e ver os problemas de saúde comuns da perspectiva dos animais. Pode-se, por exemplo, considerar como os estilos de vida humana pouco saudáveis contribuem para a epidemia de obesidade em cães e gatos. Para melhorar a saúde animal ter-se-ia, naturalmente, que fazer o desvio para ajudar os humanos a alcançar uma vida melhor. Que com isso se geraria também mais saúde humana e com melhor qualidade de vida seria, de um ponto de vista veterinário, um efeito colateral positivo, mas não o objectivo principal.
(Adaptado de uma coluna no Dansk Veterinaertidskrift)

Portugal não aplica as normas mínimas de protecção de suínos

Comissão Europeia deverá lançar, em Fevereiro, um processo de infracção contra Portugal devido à não aplicação de uma directiva comunitária sobre normas mínimas de protecção de suínos, relata Renascença. 

Infelizmente Portugal está acompanhado por mais 16 países nos quais não foi conseguido  que os agricultores alterassem as instalações durante o período de 10 anos que lhes foi dado. Mas segundo o relato da Renascença nenhum país tem aplicação tão baixa como Portugal, onde só 58% dos produtores têm as condições exigidas para porcas parideiras.

Claro que é uma altura muito pouco feliz para lançar uma notícia com estas palavras:

Mesmo quem tem um pensamento mais equilibrado do que o típico ressabiado comentador de notícias on-line há de reagir com uma boa dose de cepticismo numa altura em que abundam as notícias sobre os números crescentes de famílias com água e luz cortadas e crianças que só comem na escola. Não ajuda a fotografia escolhida para ilustrar a notícia que não tem nada a ver com as alterações importantes que a diretiva 2001/88/CE introduz.

Não se trata de se preocupar mais com os animais do que com as pessoas. Trata-se de abandonar um sistema de alojamento no qual as porcas parideiras podem viver a sua vida inteira amarradas ou enclausuradas em jaulas

 
Antes da entrada em vigor desta diretiva era permitido alojar as porcas durante a gestação neste tipo de celas, pouco maiores do que o corpo do próprio animal, não podendo este sequer virar-se 180º. Passados os 3 meses, 3 semanas e 3 dias de gestação  é dada a oportunidade à porca de caminhar um pouco para chegar às instalações onde ocorre parto e período de aleitamento, um total de cerca de 4 semanas. Depois volta para a cela de gestação. 

Os sistemas alternativos não são isentos de problemas, os quais podemos discutir a seguir. Mas, francamente, o sistema de confinamento contínuo não é vida para um ser vivo inteligente e ativo!