“Uma só Saúde” – bom ou mau para os animais?

Por Peter Sandoe

De acordo com o conceito de Uma Só Saúde, a verdadeira razão para o trabalho do veterinário é prevenir doenças humanas, como por exemplo zoonoses transmitidas a partir de animais doentes para os seres humanos através dos alimentos. Desta forma, a medicina veterinária aproxima-se da medicina humana. Tem sido defendido que esta visão não deve levar a uma menor consideração dos animais e que, pelo contrário, está destinada a ser uma situação de mútuo benefício, onde a saúde humana é assegurada através da garantia de saúde animal e do seu bem-estar.

No entanto, isso não parece ser de todo verdade. Se o objectivo é o de proteger os seres humanos, tanto quanto possível, da exposição a doenças contagiosas, a solução mais eficaz passará frequentemente por diminuir o contacto entre os animais e as potenciais fontes de contaminação externas. A consequência para um número considerável de animais de produção será mantê-los sempre fechados. Isso é bom para a segurança alimentar, mas será ideal para o bem-estar animal?
O movimento Uma Só Saúde tem sido, até agora, focado na prevenção da transmissão de doenças de animais de produção de animais selvagens para o ser humano, mas a World Small Animal Veterinary Association uniu forças com a OIE para incluir também animais de companhia, argumentando que estes têm um efeito directo na promoção da saúde humana em situações que vão desde a educação das crianças, passando pelo auxílio na recuperação de doenças, até ao acompanhamento de idosos. Isto é, os efeitos positivos dos animais de companhia para a saúde humana também desempenham um papel na perspectiva de Uma Só Saúde. Mais uma vez, os animais estão lá, mas não em seu próprio direito. O conceito Uma Só Saúde parece ser construído na premissa de que, no final do dia, apenas a saúde humana conta. Parece-me que este é um conceito questionável para os veterinários assinarem.
Em vez disso, poder-se-ia tentar dar a volta à discussão e ver os problemas de saúde comuns da perspectiva dos animais. Pode-se, por exemplo, considerar como os estilos de vida humana pouco saudáveis contribuem para a epidemia de obesidade em cães e gatos. Para melhorar a saúde animal ter-se-ia, naturalmente, que fazer o desvio para ajudar os humanos a alcançar uma vida melhor. Que com isso se geraria também mais saúde humana e com melhor qualidade de vida seria, de um ponto de vista veterinário, um efeito colateral positivo, mas não o objectivo principal.
(Adaptado de uma coluna no Dansk Veterinaertidskrift)

Author: Manuel Sant'Ana

Sou Médico Veterinário e Especialista Europeu em Bem-Estar Animal. Sou investigador em ética animal, deontologia profissional e medicina baseada na evidência pelo CIISA-FMV ULisboa e pela Ordem dos Médicos Veterinários.

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