Feliz aniversário, Animalogantes!

No passado dia 17 de Dezembro fez cinco anos que o projecto ANIMALOGOS comeҫou. Este blog nasceu da necessidade de disponibilizar na Web 2.0 um espaҫo de debate aberto, informado e rigoroso sobre a nossa coexistência com outros animais. Actualmente temos entre 1500 e 2000 visualizações mensais e apesar de sermos principalmente vistos em Portugal, temos ainda uma audiência sólida nos EUA e no Brasil.
Neste cinco anos publicámos mais de 350 mensagens, sobre os mais diversos temas que vão da experimentaҫão animal à conservaҫão passando pela produҫão animal e pelos animais de companhia. Divulgámos estudos relevantes e entrevistámos especialistas de diferentes quadrantes: filósofos, médicos veterinários e cientistas. O Animalogos tem também sido usado como ferramenta de ensino, em especial na Pós Graduaҫão de Comportamento e Bem-Estar Animal do ISPA.
O nosso mais sincero obrigado a todos os animalogantes que têm participado com mensagens, comentários e sugestões! Aqui, todos os pontos de vista são bem vindos e nenhum comentário fica sem resposta. Ao fim desdes cinco anos tivemos mais de 700 comentários e mediámos algumas discussões polémicas e estimulantes. Em Junho do ano passado criámos a página do Facebook que conta já com cerca de duzentos seguidores.
Em jeito de celebraҫão perguntámos a amigos e colaboradores qual o acontecimento mais significativo, no que aos animais diz respeito, no ano que agora termina, e a resposta não podia ter sido mais consensual: a publicação da Lei nº 69/2014, de 29 de agosto, que criminaliza o abandono e os maus tratos a animais de companhia e que entrou em vigor a 1 de Outubro. Tratou-se de um esforҫo conjunto de deputados de diferentes quadrantes políticos (algo raro, no nosso país) e que contou também com a contribuiҫão da sociedade civil, nomeadamente das propostas de alteraҫão legislativa da Associaҫão Animal (em formato de petiҫão pública) e da Ordem dos Médicos Veterinários.
A nova Lei vem adicionar ao Código Penal português um novo título dedicado aos crimes – de maus tratos e e abandono – contra os animais de companhia. Isto permite proteger os animais por si próprios, sem alterar o seu estatuto legal de “coisas”, o que para alguns é causa de alguma incoerência jurídica. A nova lei altera ainda a Lei n.º 92/95, de 12 de setembro, de forma a clarificar o papel das Associaҫões Zoófilas, mas sem tocar nos pontos mais sensíveis e que a tornaram coxa e insuficiente (e.g. como definir “violência injustificada” e “sofrimento considerável”?).
E com estas reflexões terminamos o ano de 2014, a todos desejando um excelente ano de 2015!

Texugos e Tuberculose no Reino Unido – Uma Relaҫão Complexa

Quando penso em texugos, espécie muito característica pelas grossas riscas brancas e pretas ao longo da cabeҫa, a imagem que me vem à memória é a de O Vento nos Salgueiros, série televisiva britânica da minha infância, baseada na novela infantil com o mesmo nome (The Wind in the Willows), do início do século passado.

O texugo europeu (Meles meles) pode ser encontrado um pouco por todo o continente mas é especialmente abundante nas ilhas britânicas. O velho Sr Texugo, personagem de O Vento nos Salgueiros, é sábio e solitário, preferindo a tranquilidade da sua toca ao buliҫo da superfície. Mas acontece que a realidade dos texugos britânicos pouco se assemelha à pacata vida do Sr. Texugo. Desde que estudos científicos descobriram que os texugos são o principal (?) reservatório do Mycobacterium bovis, e portanto importantes focos de transmissão da tuberculose bovina (bTB), que estes listrados mustelídeos nunca mais tiveram descanso.
Há décadas que o abate massivo de texugos (badger culling) tem sido a medida imposta pela autoridade sanitária no Reino Unido (DEFRA), de forma a prevenir a transmissão da tuberculose de texugos a animais domésticos (especialmente bovinos leiteiros, mas também cães e gatos) e destes a seres humanos (principalmente pelo consumo de leite não pasteurizado). Estima-se que entre 1975 e 1997, mais de 20 000 texugos tenham sido abatidos. Nos anos 80, os texugos eram gaseados no interior das suas tocas. Actualmente, os animais são mortos a tiro por caҫadores licenciados (marksmen) em montarias patrocinadas pela DEFRA, mas apenas em zonas rurais do sul de Inglaterra.

A eficácia do abate de texugos no controlo da doenҫa é alvo de um aceso debate e que está longe de estar resolvido. É sabido que outros animais silvestres, como veados, são também importantes focos de infecҫão natural, mas os texugos parecem ter garantido o estatuto de bode expiatório do falhanҫo de todas as medidas de controlo da tuberculose bovina. O governo mostra números a justificar o abate e de como a situaҫão da doenҫa seria muito pior do que a que existe hoje, caso os animais não fossem abatidos. O abate tem custado anualmente milhões de libras, pagas pelo erário público, e estudos independentes sugerem que traz poucos benefícios, para além do sentimento de seguranҫa para agricultores e consumidores. Especialistas alertam para o facto de que o abate localizado e de um número insuficiente de animais (terá sido isso que aconteceu este ano) não só torna a medida ineficaz como pode inclusivamente aumentar o risco de transmissão da bTB às espécies pecuárias, provavelmente porque os texugos infectados passam a ocupar nichos ecológicos maiores (e.g. podem percorrer maiores distâncias para procriar).

SOURCE: bbc.com

Além disso, a medida tem provado ser cruel já que até 18% dos animais demoram mais de cinco minutos a morrer, intervalo de tempo a partir do qual o abate é considerado ‘inumano’. E embora este seja um tema que tem dominado a opinião pública durante décadas e o enorme esforҫo financeiro envolvido, a verdade é que não existe actualmente investigaҫão sobre métodos de abate alternativos.

Em relaҫão a métodos alternativos ao abate, decorre desde Setembro uma campanha de vacinaҫão de texugos, Badger Edge Vaccination Scheme, também patrocinada pela DEFRA mas que depende da iniciativa privada para ser implementada. A ideia é criar um cordão sanitário (feita de texugos vacinados) entre zonas indemnes e zonas afectadas por bTB em animais domésticos, prevenindo-se assim a propagaҫão da doenҫa. Durante anos a vacinaҫão foi proibida pois havia o risco de se fazer passar animais portadores por animais vacinados, mas a estratégia mudou assim que se tornou evidente que o badger culling, por si só, não será suficiente para controlar a epidemia de bTB. Só em 2013, mais de 26 mil cabeҫas de gado, infectadas com tuberculose, foram abatidas no Reino Unido.

Sobre boa e má fotografia: uma história de cães

Esta mensagem surgiu de uma associaҫão de temas dispersos que se uniram numa ideia comum. Desde que me mudei para a Irlanda, mais ou menos ao mesmo tempo que a minha subscriҫão do jornal Público expirou, que me mantenho permanentemente ligado a três jornais: o The Guardian, o El País e, mais recentemente, o Observador. Um novo mundo de interconectividade, por vezes fonte de distracção mas também geradora de inspiraҫão e criatividade.
E foi nestas deambulaҫões que soube do trabalho da fotógrafa alemã Julia Christe. Julia criou uma série fotográfica sobre cães voadores a que chamou Freestyle. Ao que parece, os cães são lançados pelos próprios donos para um colchão enquanto Julia capta o ‘instante decisivo’ (expressão cunhada pelo fotógrafo francês Henri Cartier-Bresson).

Mas não é preciso ser-se cinólogo para se perceber que os cães não estão a achar a mínima piada à brincadeira. Basta olhar-lhes bem nos olhos. Noutros animais, ao contrário dos humanos, não é normal ver-se a esclera, isto é, a parte branca do olho. É sabido que a exposição da esclera é indicadora de estados mentais negativos (stress, dor, sofrimento) em cães, vacas e outros animais. Quanto mais branco se vir, pior o estado mental. Isto está em oposição com o que se passa na espécie humana, onde a brancura ocular está associada a saúde, beleza e aptidão reprodutiva.
Por outras palavras, o Husky fotografado não está a curtir o salto, como parece indicar a inscrição que acompanha a fotografia no The Guardian: “Much falling. So levity. Wow! An adorable husky drops.” Ele está antes apavorado. Se houvesse uma expressão canina de terror, seria esta. Estes retractos não são só condenáveis. São também má arte porque desprovidos de conteúdo e penso que isso me deixa igualmente incomodado. Já agora, vejam a série Studie Faces e façam um exercício semelhante.
Em total oposição a este frívolo exercício estão as cino-foto-reportagens da fotógrafa britânica Julie McGuire. Ao contrário da sua homónima alemã, Julie fotografa cães com um propósito que vai para além da graça de retractar animais. Em Hounds of Hope Julie conta-nos a história da Penang Animal Welfare Society, associação zoófila malaia criada por uma aposentada alemã (Barbara Janssen) que foi viver para a Malásia para socorrer animais abandonados. Actualmente toma conta de mais de 250 cães num exercício que parece ter tanto de louvável como de condenável.

A fotografia aqui reproduzida é especialmente impactante e está entre as vencedoras do World Press Photo 2014. As razões são evidentes, mas ainda assim faço aqui um exercício de interpretação. A fotografia mostra-nos uma divisão do que foi antes uma casa, agora transformada em canil. Ela é abruptamente cortada em duas metades iguais por uma viga (de madeira?) que quase nos obriga a dar um passo atrás. A metade direita é feita de movimento, com vários animais em poses contorcidas e aleatórias. A metade esquerda, é toda ela tensão, com os animais hirtos e focados num mesmo ponto. Por fim, os tons sépia (quase monocromáticos) parecem conferir solenidade ao tema. E perguntamo-nos: como pode alguém trocar o conforto de uma reforma na Europa rica por uma entrega total, caótica e desinteressada aos animais no sudoeste asiático?

A epidemia de Ébola chegou ao nosso quintal – e aos nossos animais!

A crise de saúde pública em Espanha, desencadeada pelo contágio directo do Ébola – o primeiro conhecido fora de África – entre um paciente e uma auxiliar de enfermagem do Hospital Carlos III, nos arredores de Madrid, segue tão descontrolada como a propagação do próprio vírus. Por entre acusações de falta de coordenação da direcção do Hospital, equipamento desadequado, treino insuficiente, impacto das medidas de austeridade no sistema de saúde espanhol, nada nem ninguém parece ficar imune à propagação do vírus (ou pelo menos, às suas consequências).
A mais recente vítima colateral desta epidemia – que parece retirada do filme Contagion (Steven Soderbergh, 2011) – é o cão da enfermeira infectada. A pedido das autoridades sanitárias da Comunidad de Madrid, um juiz autorizou hoje o abate de Excalibur, um American Stanfordshire Terrier de 12 anos de idade. O marido da enfermeira – também ele internado para observação – lançou um apelo nas redes sociais para que Excálibur seja poupado, com o apoio do partido animalista PACMA e da associação AXLA (Amig@sXlosanimales). A campanha #SalvemosExcalibur conseguiu reunir umas cinquenta pessoas à porta de casa da enfermeira, onde o cão está sozinho, depois do internamento dos seus donos.

Embora o papel dos animais domésticos na propagação do Ébola seja desconhecido, sabe-se que cães podem ser portadores assintomáticos do vírus e representam potencial risco de contágio. No entanto, Eric Loy, um especialista na transmissão do Ébola, discorda com a solução encontrada pelas autoridades espanholas, já que cão representaria uma fonte importante de informação sobre o vírus e sobre a sua transmissão. Em vez do abate, o cão deveria ser isolado e usado como ferramenta estudo. Uma petição, propondo algo semelhante, foi entretanto criada.

Peter Piot, um dos investigadores que descobriram o vírus em 1976, nunca pensou que o Ébola pudesse causar grandes riscos epidemiológicos, dada a natureza episódica e localizada dos anteriores surtos da doença. Mas agora o responsável europeu da Organização Mundial da Saúde (OMS-WHO) já admite que incidentes como o de Espanha se venham a repetir noutros países europeus, dada a proximidade e as deslocações frequentes entre os dois continentes.

Produção pecuária e bem-estar animal – Debate

Está disponível o vídeo que resultou do debate sobre Produção Pecuária e Bem-estar Animal (que teve lugar na Faculdade de Ciências da U.Porto a 22-11-2012), organizado pelo projeto Ciência 2.0 e no qual participaram autores do Animalogos. Em estúdio esteve a Anna Olsson (IBMC) na companhia da Virgínia Joaquim (Associação Zoófila Portuguesa) e de José Oliveira (Confederação de Agricultores de Portugal), com a moderação do jornalista Daniel Catalão. 
Foi sem dúvida um debate construtivo, pontuado por perguntas pertinentes do público presente. Gostei particularmente da forma como a Anna lidou com a pergunta do acesso aos estados mentais (‘sentimentos’) dos animais, comeҫando a resposta pelas metodologias mais progressistas mas também mais fáceis de entender por um público leigo (o Qualitative Behaviour Assessment e a Mouse Grimace Scale) e só depois explicando os testes etológicos mais clássicos. Também gostei que, do pouco que retiraram da minha entrevista, tenham seleccionado a parte sobre a insuficiente protecção da vaca leiteira, opinião que teve reflexo nas palavras do Presidente da APROLEP. Este tema foi também trazido a debate por outro membro do público relativamente ao efeito da genética sobre o bem-estar dos bovinos leiteiros. No entanto, a resposta rápida – mas irreflectida – da Virgínia Joaquim, atirou as culpas para a selecção artificial como um mal em si próprio, esquecendo – como apontou a Anna – que a melhoramento genético também permite seleccionar para a saúde e a longevidade.

Petição para abolir a caça à Rola-Brava

 A QUERCUS lançou uma petição para proibir a caça à rola-brava (Streptopelia turtur). Se não concorda com a caça não lhe será difícil assiná-la. Mas mesmo que seja caçador, ou de alguma forma adepto da caça, esta petição é também para si. De facto, a rola-brava já foi no passado uma das aves mais abundantes da nossa avifauna, e daí ser chamada também de rola-comum. Mas qualquer caçador saberá que hoje em dia caçar uma rola é uma raridade e poucos serão aqueles que o farão sem se questionarem sobre o futuro da espécie.
Esta petição, da autoria da maior associação nacional de conservação da natureza, está longe ser perfeita; seria mais razoável pedir uma suspensão da caça por um período de, p.e., uma década em vez da liminar proibição. Os poderes políticos, por norma, não gostam que as coisas lhes sejam impostas, mas antes sugeridas. Não vem acompanhada por dados científicos sobre a ocorrência da espécie no nosso país, dados esses que existem e que, além disso, oferecem possíveis soluções para prevenir o seu declínio. Também não se compreende a alusão às aves aquáticas e ao uso do chumbo no mesmo documento, numa espécie de “já agora”. A meu ver, cada tema deve ser tratado separadamente e com devida profundidade, o que não é o caso.
Ainda assim, por uma gestão cinegética sustentável, é importante suspender a caça à rola-brava e por isso assino esta petição.

Carne de Galinha – o maior problema de saúde pública na Europa?

A epidemia de infecҫões por Campilobacter pilori na Europa, levou o jornal de referência The Guardian a fazer uma investigaҫão secreta à industria avícola no Reino Unido, o maior consumidor europeu de carne de galinha. Estima-se que só neste país 280 mil pessoas sejam infectadas por Campilobacter, uma bactéria que para além de transtornos gastro-intestinais, é capaz de atacar o sistema nervoso e causar lesões neurológicas irreversíveis e até mesmo a morte. 

De forma a prevenir este tipo de infecҫões, que na sua maioria são contraídas através da manipulaҫão de carne de galinha crua, a Food Standards Agency alerta os consumidores para não lavarem a carne. Ao invés, a carne deve ser cozinhada directamente, eliminando assim quaisquer contaminantes que lá possam existir.

Isto traz-nos de volta ao tema do verdadeiro preҫo da comida barata, nomeadamente da proteína animal. O paradigma da produҫão avícola é o preҫo. Quando uma galinha inteira é vendida a 3€, e quando sabemos que a maior parte do lucro fica no retalho e não no produtor ou na transformaҫão, que são quem realmente influenciam a qualidade e seguranҫa do alimento, o desafio que se põe é como infuenciar positivamente uma indústria que não tem margem de manobra.

Magia para Cães

Com mais de 14 milhões de visualizações, os vídeos de Magia para Cães de Jose Ahonen, mágico e mentalista finlandês, são um enorme sucesso.
Claro que, pelos comentários, nem toda a gente parece concordar que se faça tamanha artimanha aos pobres canídeos, simplesmente para nos entreter. Mas de todas as coisas que nós humanos fazemos a cães (nomeadamente Exposições Caninas e Concursos de Beleza) esta parece ser a mais inocente (e divertida) de todas. Para mim o que me cativa nestes videos não é tanto a reacção dos cães mas mais a razão de ser dela. Porque se Ahonen se limitasse a esconder o biscoito por entre os dedos ou na manga, não seria fácil para os cães detectar o biscoito pelo odor? Mas os cães parecem não fazer ideia para onde o biscoito foi parar. Enganar um humano é fácil, pois muitas vezes vemos aquilo que esperamos ver. Mas enganar um cão parece-me ser mais difícil. Sugestões?

Petição para abolir o uso do Diclofenac na Europa

Fonte: BBC – Poisoning drives vulture decline in Masai Mara, Kenya
Está a decorrer uma petição enderaçada aos Comissários Europeus do Ambiente e da Saúde para abolir o uso do medicamento veterinário Diclofenac no espaço europeu. Este anti-inflamatório não esteróide é usado há décadas no combate da dor e inflamação em ruminantes (bovinos, ovinos e caprinos). Trata-se, no entanto, de uma droga altamente nefrotóxica noutras espécies, nomeadamente cães e aves. Especialmente vulneráveis são as espécies necrófagas – como os abutres – que se alimentam das carcaças de ruminantes medicados com diclofenac. Segundo o Programa Antídoto-Portugal:

dados relativos à mortalidade massiva de várias espécies de abutres em países asiáticos, nomeadamente na Índia e no Paquistão (…) revelaram que a elevada diminuição anual de adultos e sub-adultos se devia à insuficiência renal que era provocada pela ingestão de cadáveres com resíduos de Diclofenac, um anti-inflamatório de uso veterinário com que os ruminantes são medicados naquela região (Oaks et al. 2004).

Com o advento de novas drogas mais seguras e eficazes (como o meloxicam) o uso sistémico de diclofenac não apresenta qualquer benefício (para os animais tratados, a saúde pública e as espécies selvagens) que não seja o seu baixo preço. No entanto, a sua comercialização é permitida em Espanha e Itália, onde residem 80% dos abutres da Europa. Acresce o facto de que qualquer medicamento veterinário vendido em Espanha rapidamente se torna disponível em Portugal, já que existe um mercado paralelo que permite que os produtores pecuários se abasteçam, sem grandes dificuldades, de medicamentos para os seus animais no país vizinho.

O valor ecológico dos abutres – espécies que podem ser facilmente avistadas em Portugal nas regiões raianas do Tejo e do Douro Internacional – é inestimável e o seu papel na remoção de carcaças e prevenção de doenças insubstituível. Assinar a petição é, por isso, um dever de cidadania.

Outra vez Marius, e o abate de animais saudáveis em Zoos.

O caso de Marius – a girafa que foi abatida no Zoo de Copenhaga, necropsiada em público e dada de comer aos leões – continua a dar que falar. No vídeo aqui reproduzido podemos observar como o Director do Zoo de Copenhaga, Bengt Holst, procura defender-se de forma serena do criticismo apaixonado por parte do jornalista do Channel 4, Matt Frei. Esta entrevista espelha bem o confronto de valores entre duas formas muito diferentes de entender o papel dos animais na sociedade.
O Director do Zoo justifica a prática como sendo uma aproximação à natureza. No estado selvagem a girafa também é comida por leões e a autópsia pública permite um exame naturalista do interior de uma girafa, com evidentes benefícios pedagógicos. Em resposta à pergunta ‘Gosta de animais?’ Bengt Holst responde que sim, em função de manter populações saudáveis. Para Bengt Holst, o valor moral está no grupo ou população e não tanto nos indivíduos que compõem o grupo. Por outras palavras, o todo vale mais do que a soma das suas partes.
O jornalista, por seu lado, procura enfatizar a componente emocional, usando termos como ‘crueldade’, ‘desmembramento’, ‘crianças horrorizadas’, e acusando o entrevistado de usar uma linguagem ‘clínica e fria’. Para ele, o valor parece estar nas relações que nós humanos estabelecemos com os outros animais. No entanto, Matt Frei não é capaz de articular um único argumento válido para contrapor as justificações do entrevistado. Mais do que o abate em si, o jornalista parece chocado com o facto de Marius ter apenas dois anos e ser saudável. Mas não parece fazer sentido esperar que os animais fiquem doentes ou velhos para que o seu abate se torne permissível.
A discussão enfatiza a diferença fundamental entre o abate de Marius e o abate de outros animais selvagens (como coelhos e roedores) para controlo das suas populações: a qualidade de “praga”. Aqueles mamíferos silvestres que são considerados pragas podem ser abatidos, mas o mesmo não se passa com girafas em zoos. A resposta de Holst espelha bem este dilema: mas quem decide o que é uma praga?
Uma crónica publicada ontem por Hannah Barnes, jornalista da BBC, procura contextualizar o abate de animais em Zoos. Trata-se de uma prática recorrente na gestão de um Zoo, nomeadamente daqueles que são membros da Associação Europeia de Zoos e Aquários (EAZA). Segundo a jornalista, na semana anterior ao escândalo de Marius um outro Zoo dinamarquês, o Odense Zoo, tinha abatido dois leões. Os exemplos de abate incluem ainda zebras no Reino Unido, hipopótamos em Portugal ou crias de tigre na Alemanha. Para mim, o mais curioso desta história é que à medida que os Zoos melhoram as usas práticas e a qualidade de vida dos animais em cativeiro aumenta, mais hipóteses existem destes se reproduzirem e maior número de animais terá de ser abatido para manter populações captivas saudáveis.