"Será que dá pums"?

“As cobras dão pums?”
Foto de Ethan Kocak (Fonte)
Parece uma pergunta que o Bart Simpson faria numa aula de Biologia, e foi de facto esta pergunta de um adolescente ao seu irmão biólogo que desencadeou um rebuliço entre a comunidade científica no Twitter com a hashtag #doesitfart.
E dessa discussão saiu o livro “Does it fart?“, de Nick Caruso e Dani Rabaiotti (com contribuições de cientistas e criadores da Twitterosfera) e ilustrações de Ethan Kocac.
Neste livro encontra respostas científicas para questões tão importantes como:
– Que animais dão pums?
– Porque é que as ameijoas arrotam mas não dão pums?
– Porque é que os das hienas cheiram particularmente mal?
– O que é um pum, afinal?
Neste livro encontrará tudo aquilo que sempre quis saber (ou não) sobre a flatulência animal e é  prenda perfeita para aquela pessoas que gostam de biologia, animais, têm sentido de humor e tem a mania que sabem tudo.
Acho que é um livro ideal para mim!

Animalogos em congresso


Há duas semanas estivemos no congresso de UFAW – Universities Federation for Animal Welfare em Zagreb. Ou mais corretamente, estive, porque ao contrário de há 2 anos em que estivemos todos presente, fui sozinha em representação dos três animalogantes, para apresentar o nosso trabalho sobre quantidade e qualidade de vida (mais sobre isso abaixo).

Desde o primeiro em que participei (2001, em Londres), considero os congressos de UFAW uma prioridade profissional por vários motivos. São sempre excelentes, focando um tema com relevância e pertinência, com palestrantes de renome internacional. São inspiradores, tanto pela qualidade das palestras como pela diversidade da participação. Aqui encontra-se não só académicos, mas pessoas de todo o tipo de organismos governamentais e não-governamentais na área de bem-estar animal. Quem quer saber mais concretamente do que foi falado no congresso, encontra um relato no Twitter do UFAW.

Na nossa apresentação abordamos o dilema de quantidade e qualidade de vida, com base em três exemplos: a (redução em) longevidade da vaca leiteira, as formas de criar vitelos machos de raças de produção de leite e a tensão entre redução e refinamento na experimentação animal. O trabalho resulta do desafio que aceitamos em 2013, de contribuir para o livro Dilemmas in Animal Welfare (CABI Publishing, 2014).

Além das palestras, consegui aproveitar um bocado da hora do almoço para visitar o Croatian Museum of Naïve Art e a sua coleção que não podia ser mais tematicamente relevante para um congresso onde a relação humano-animal está em enfoque.

O Mocho Sábio – Uma sugestão de Natal

A história d’O Mocho Sábio “conta a história de um casal de mochos galegos, a Sancha e o Raimundo que estão apaixonados e escolheram um bonito local para viver. Mas a Sancha não consegue pôr ovos e anda muito triste. O casal tem um amigo sábio, o mocho Al-Kibir. O Al-Kibir vive na Quinta das Ardósias com o Dr. Alcobia, um sábio farmacêutico, reformado, cuja biblioteca faz as delícias do Mocho Sábio: aí aprendeu a ler e adquiriu conhecimentos que se vão revelar muito úteis.“
Este é o primeiro livro da colecção “A Vida Selvagem”, da Editora Escrivaninha. O livro é ilustrado por 24 aguarelas e conta com o prefácio de João Eduardo Rabaça, Professor de Biologia da Universidade de Évora.
Em associação com a ALDEIA, este livro pretende angariar fundos para o projecto STRI – Rapinas Nocturnas de Portugal. Especificamente, os lucros obtidos – 4€ por cada livro vendido – têm em vista a contribuição para a colocação de uma câmara de vigilância numa caixa-ninho de Tyto alba (Coruja-das-torres) para que seja possível acompanhar a nidificação de um casal desta espécie.
O preço de venda é de 10€. Para adquirir o seu livro, contacte a associação ALDEIA através do e-mail rias.aldeia@gmail.com.

Conversas inspiradoras

What is life? é o nome de um ciclo de dialogos interdisciplinares entre investigadores e docentes de diversas faculdades, a ter lugar no ICBAS, Universidade do Porto durante os próximos meses. Os organizadores Maria Strecht Almeida e José Augusto Pereira propõem conversas a partir do livro What is life do Erwin Schrödinger. A programação já está anunciada para a primeira sessão, dia 28 de Outubro e a segunda sessão, dia 11 de Novembro.

A imagem aqui ao lado é uma das muitas manifestações interessantes da vida, não só para quem se interessa por animais em geral mas também que estuda aspectos particulares de evolução e desenvolvimento. Não é o vulgar ratinho que parece, é um mamífero de uma classe taxonomica que não temos na Europa: os marsupiais. A razão deste opossum Monodelphia domestica de estar neste poste é a conferência que houve ontem também no ICBAS em que a Professora Yolanda Cruz da Oberlin College, Ohio, EUA partilhou com alunos e outros interessados alguns aspectos do seu trabalho com o marsupial Monodelphis domestica. Na pequena introdução no video clip aqui, descreve como e porque trabalha com estes mamíferos, originarios da America do Sul.
https://youtube.googleapis.com/v/JFhpaUJbsSM&source=uds

Foi uma conversa inspiradora também para quem ensina e investiga, pelo entusiasmo e pela abordagem inovadora que mostra. No Oberlin College, apenas há undergraduates, ou seja alunos do equivalente do 1º ciclo de ensino superior. Portanto, sem envolvimento de alunos de mestrado ou doutoramento, toda a investigação no laboratório da Yolanda Cruz é feita em forma de pequenos projetos de alunos do 1º ciclo de biologia e bioquimica.

Beyond animal rights: Crítica de livro

Esta crítica do livro Beyond Animal Rights: food, pets and ethics, Tony Milligan; Continuum International Publishing, foi originalmente publicada na revista Animal Welfare.
 

Este livro propõe como tema a ideia do vegetarianismo estar longe de ser moralmente perfeito, e de como isso não serve como uma desculpa para a maior parte de carne que a maioria de nós come. Assim vale a pena ler, seja qual for a dieta preferencial de cada leitor – e quem preferir uma versão curta da crítica deste livro, pode parar de ler por aqui. Mas neste caso, leia o livro (ou pelo menos os seus primeiros cinco capítulos).
Tom Milligan é Honorary Research Fellow em Filosofia na Universidade de Aberdeen, e esta a sua reflexão sobre o consumo de carne é publicada na série “Think Now” (da editora Continuum)  de “livros acessíveis que examinam problemas-chave da sociedade contemporânea de um ponto de vista filosófico”. De facto, o livro de Milligan encaixa perfeitamente nesta descrição; a sua escrita clara e bem fundamentada proporciona uma leitura agradável e intelectualmente estimulante. 
A problemática da ética animal ocupa uma posição central, mas não é a única perspectiva considerada. Sendo ele próprio vegan, Milligan não considera a perspectiva padrão dos direitos dos animais como a única relevante para uma escolha moralmente guiada das nossas opções alimentares. O seu conceito da alimentação reflecte a abrangência da sua análise: “it involves things of the following sort: enjoyment in and through food, nutritional appropriateness given the condition that we are in; a degree of honesty about what we are eating; some rudimentary knowledge about how our food was produced; eating in a way that enriches our relations with other humans (e.g. it should not involves habitual solitary consumption); eating in a way that is consistent with our values and/or expresses those values; having values that are themselves of a reasonable and defensible sort; eating in a way that involves a practical awareness of the importance of other humans, other creatures and our shared environment” (página 20)
Dos cinco capítulos dedicados ao consumo de carne, o primeiro de todos, “The Depth of Meat-Eating”, oferece um olhar geral e serve de introdução ao tópico. No capítulo 2, “An Unwritten Contract”, explora a ideia de que a agro-pecuária e o consumo de carne oferecem um bom “contrato” aos animais, como grupo, na medida em que lhes permitiu que prosperassem, em número. Por um lado, é um fraco negócio para os animais que pagam pela protecção e alimento com a sua morte precoce, e que por vezes é precedida por uma vida que não vale a pena ser vivida. Por outro lado, em condições que proporcionam uma vida que valha a pena ser vivida, o argumento de que de outro modo estes animais não teriam sequer existido é muito forte. Isto deixa-nos com uma situação “in which rival considerations can be balanced up against each other but no single consideration obviously trumps the others. On the one hand, the opportunity of life argument does real work (…) to give some justification for ethically informed meat-eating. It is the means by which animals come into existence and enjoy some approximation to a good, if short, life. (…) Ethical vegetarianism, on the other hand, might better save the interests of already existing creatures” (página 40)
“Vegetarianism and Puritanism” (Capítulo 3) analisa a possibilidade de que a recusa ao consumo de carne possa ser motivada por algum tipo de puritanismo. Isto não só inclui a ideia de abandonar algo potencialmente desfrutável (este não parece ser o caso para a maioria dos vegetarianos e vegans), de não ingerir algo “sujo” ou alguma maneira prejudicial ao corpo (historicamente verdadeiro; até certo ponto também presente nas motivações contemporâneas), bem como a ideia de manter as mãos limpas do sangue derramado pelo abate dos animais, o que é parcialmente verdade, ainda que “there will always be a blood price to pay for a harvest. The numbers of animals inadvertently killed through harvesting can be reduced with caution (…) but the taking of animal lives cannot be avoided. Recognition of this is a matter of acknowledging that the presence of we humans as part of our planetary eco-system is always, to some extent, at the expense of other creatures. And this is one of the many things that vegetarians, vegans and carnivors have in common” (páginas 62-63).
O capítulo 4, “Diet and Sustainability”, foca-se nos aspectos ambientais das diferentes aspectos que envolvem as diferentes opções alimentares. Milligan considera que a produção de carne actual deixa uma pegada ecológica inaceitável, mas também que há terreno que só pode contribuir para a alimentação humana atraves de produção de carne e leite de animais de pastoreio. Tendo em consideração todos os factores (tanto quanto a complexidade do problema o possibilita), Milligan admite que uma dieta contendo pequenas quantidades de carne de origem local e produzida com respeito pelo ambiente, poderá ser tão ou mais sustentável que uma dieta vegetariana. Mas de imediato observa não ser esta a dieta típica de um consumidor de carne, e que “(t)here is just as much danger that the sheer possibility of an eco-friendly carnivorous diet may be used as a stalking horse to provide dubious justification for widespread carnivorous practices that are not nearly as eco-friendly as their practitioners may assume” (página 84). O valor ecológico do consumo limitado de carne, é a razão pela qual o veganismo, como opção universal, poderá ser “The Impossible Scenario” (Capítulo 5), mas que um vegetarianismo universal, que permita alguma produção animal, poderá ser mais exequível. 
Apesar da capa nos mostrar o processo de triagem de salmão (selvagem?) capturado em Vancouver, o livro é na realidade centrado na alimentação humana através da produção agro-pecuária. Millingan faz um trabalho excelente na análise desta actividade, tendo em consideração uma grande diversidade de factores. Infelizmente, os capítulos 6 e 7 (sobre a posse de animais de estimação e experimentação animal) não estão ao mesmo nível do resto do livro e, dado estes temas estarem apenas indirectamente ligados ao tema principal, não fica de todo claro por que razão foram incluídos. A sua omissão numa futura edição tornaria este livro uma pequena mas brilhante discussão do consumo de carne que poderia ser uma leitura obrigatória para todos os estudantes universitários em cursos ligados à produção animal. 

Traduzido do inglês por Nuno Franco.

Jerry Coyne: Porque é que a evolução é verdade mas poucos acreditam nela?

PORQUE É QUE A EVOLUÇÃO É VERDADE (MAS POUCOS ACREDITAM NELA)?

Casual Conferences
Orador: Jerry Coyne
06 OUT 2012 (Sáb), 15h30
Auditório da Fundação de Serralves, Porto

Entre as maravilhas que a ciência tem revelado acerca do universo, nenhum assunto desperta maior fascínio e debate do que a evolução. Porém, raramente se menciona aquilo que importa: as provas, os dados empíricos que demonstram o processo de evolução por selecção natural. E essas provas são extensas, variadas e grandiosas, provindo de um espectro alargado de investigação científica, desde a genética, a anatomia e a biologia molecular, até à paleontologia e à geologia.
Nesta palestra, Jerry Coyne, um dos mais conceituados biólogos evolucionistas a nível mundial, apresentará um resumo sucinto e acessível dos factos que corroboram o processo evolutivo – incluindo as provas que reuniu no seu já famoso livro A Evidência da Evolução, cujo lançamento em português terá lugar nesta sessão, e provas adicionais que surgiram desde então. Ao demonstrar a existência da «marca indelével» dos processos inicialmente apresentados por Darwin, Jerry Coyne mostrará que a evolução é mais do que uma teoria: é um facto de que ninguém pode duvidar. Apesar disso a ideia de evolução continua a ser rejeitada por muita gente em todo o mundo. Jerry Coyne discutirá as razões desta resistência e sugerirá algumas estratégias que tornarão mais consensual a teoria da evolução.

Quando os macacos se apaixonam: Recensão

Por Paulo Gama Mota, Director do Museu de Ciência e Professor Associado da Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade de Coimbra.

Com o subtítulo ‘A vida afetiva dos animais: das pequenas formigas aos gigantes elefantes’, esta obra de George Stilwell (Edição Esfera dos Livros, 2012) procura apresentar a um público leigo, mas interessado, alguns aspectos mais interessantes e singulares do comportamento reprodutivo dos animais.  O livro está bem escrito, num estilo rápido e cativante, em que o autor recorre com grande frequência a analogias humanas, que contribuem, através de paralelismos antropomofizantes, para criar uma ligação e empatia com o comportamento desses animais. 

O olfacto sexual das moscas da fruta, machos de abelha cujos genitais ficam na fêmea, pavões com caudas que são semáforos sexuais, pénis destacáveis do argonauta, os repertórios do pardal-cantor, o contraditório macho esgana-gata, a monogamia dos pinguins reais, o parasitismo dos cucos, a sabedoria intrínseca de um picanço a atacar um escorpião, a aprendizagem social em corvos, o desenvolvimento do canto em bicos-de-diamante, o logro químico nas formigas, ou visual nos pirilampos, são alguns dos muitos exemplos passados em revista. A narrativa não se detém muito em cada exemplo. Apresenta-o com uma pincelada, de onde se destacam os elementos com que se pretende ilustrar uma regra, ou um princípio do comportamento, ou uma singularidade. O livro organiza-se em sete capítulos abordando questões reprodutivas como a escolha do par, a gestação, ou os cuidados parentais, e outras que decorrem da existência, como a complexa questão do desenvolvimento do comportamento, a vida social e as situações de cooperação e conflito.
O estilo da escrita adequa-se bem ao público-alvo, não procurando uma caracterização exaustiva do comportamento reprodutivo dos animais, com exposição das teorias explicativas associadas. A preocupação do autor vai antes no sentido de suscitar o interesse do leitor que conduza a outras leituras mais aprofundadas sobre um determinado tema. Mostrar quão fascinante e diversificado pode ser o comportamento animal, é a principal motivação do autor. 
À organização dos exemplos subjaz um conjunto de princípios e teorias científicas, que apenas são aflorados para uma explicação contextual. Os comportamentos extra-par são justificados para aumento da diversidade genética, ou da evolução dos cuidados parentais em função das vantagens para a espécie, ou a evolução do canibalismo filial que é apresentada como vantagem selectiva para a descendência. 
É aqui que encontramos problemas na consistência teórica de alguns argumentos.
A obra oscila entre a lógica do interesse da espécie e a do interesse dos indivíduos ou dos genes, adoptando frequentemente a posição do ‘interesse da espécie’, como é claramente explicitado logo no início, na p. 18 e depois na explicação dos conflitos de interesses entre os sexos quanto aos cuidados parentais (p. 78-9) ou na forma confusa como o assunto do canibalismo é tratada (p.103-5). O argumento ‘para o bem da espécie’ foi desmontado no campo teórico, na década de 60, pelos trabalhos de George Williams, Bill Hamilton e John Maynard Smith, que mostraram que o comportamento evolui não por causa do interesse da espécie, mas o dos indivíduos ou dos genes que transportam. Quando um macho de leão matam as crias de outros machos, a fêmea fica fértil mais cedo, o que implica que pode mais rapidamente conceber crias do novo macho. O comportamento não é vantajoso para a espécie, mas evoluiu por ser evolutivamente vantajoso para o macho em questão.
Um outro aspecto que me merece crítica é o raciocínio teleológico subjacente à análise dos processos evolutivos: “A racionalidade da Evolução faz-se sentir na forma como reajusta o sucesso reprodutivo […] à exigências da situação”(p. 20) e que encontramos em inúmeras passagens na obra.  A evolução resulta de um processo puramente mecanístico decorrente de haver diferenças genéticas entre os indivíduos e de estes competirem por recursos. Atribuir-lhe uma inteligência e uma intencionalidade que não possui, embora possa facilitar o discurso e a explicação, é errado e conduz inevitavelmente a que se construam quadros mentais errados sobre a evolução dos comportamentos. 
O estilo de analogias antropomorfizantes utilizado para criar familiaridade ou fazer uma piada com a situação, com referências a reduções nas saídas do casal ao cinema (p. 64) como analogia para os custos dos cuidados parentais, ou às fêmeas preferirem a inteligência à força bruta (p. 21), pode ser excessivo para alguns, ao cruzar uma linha fina entre descrição factual e interpretação excessiva. Há vantagens e desvantagens neste processo de escrita, que o autor reconhece ao discorrer, no prefácio, sobre a intencionalidade do comportamento animal e sobre as inferências que nos é permitido fazer acerca da mesma. Neste caso, as vantagens de aproximação com o leitor compensam as desvantagens da interpretação distorcida ou menos precisa.  

De um modo geral, o propósito de divulgação do comportamento sexual entre os animais é conseguido de forma interessante, embora o estilo antropomorfizante possa provocar uma reacção menos positiva por parte dos biólogos do comportamento. Uma revisão da discussão sobre conceitos evolutivos, em futuras edições deste livro, seria desejável para que possa melhor servir a sua dupla função de entreter e de informar.

A Worldview of Animal Law – Breve Recensão

Por Orsolya Varga, jurista e bolseira de pós-doutoramento,IBMC-UP

Direito Animal é uma área relativamente nova do Direito que examina como a lei trata os animais. Os animais são legalmente considerados como propriedade, o que molda os instrumentos jurídicos existentes. Embora o estatuto de propriedade dos animais não tenha sido alterado desde a Antiguidade, o facto de os animais serem seres sencientes distingue-os das restantes propriedades, o que tem vindo a ganhar reconhecimento legal Até há pouco tempo, os únicos animais a receberem alguma atenção legal significativa foram aqueles com valor económico, tais como suínos, ruminantes e cavalos de tracção. Actualmente, por exemplo, a crueldade sobre animais (vertebrados) é um crime, independentemente do animal ser propriedade de alguém ou ter valor económico.

O Direito Animal foi-se tornando popular a partir dos anos 1990: faculdades de direito começam a oferecer cursos de direito animal, livros de texto são publicados, e várias conferências são organizadas em todo o mundo. O motivo deste texto é um livro recentemente publicado sobre o direito animal e intitulado A Worldview of Animal Law (Uma visão Global do Direito Animal) de Bruce A. Wagman e Matthew Liebman (Carolina Academic Press, 2011). Este livro não é um compêndio para alunos de direito, nem um resumo abrangente das leis de um país específico; ao invés, fornece uma explicação geral sobre as questões emergentes em direito animal. Assim, se estiver à procura de legislação animal específica, nacional ou internacional, o melhor é consultar uma base de dados, como por exemplo, AnimalLaw.com.

“Uma visão Global do Direito Animal” faz perguntas fundamentais como: que valores ou políticas explicam a cobertura legal de certos animais, mas não de outros? Porque é que, por exemplo, os acordos internacionais protegem os animais em extinção, mas não os mais comuns? Por que é que as leis de muitos países protegem os animais de produção mas não os animais de companhia? O livro tem cinco áreas temáticas: uso comercial de animais para alimentação e entretenimento, crueldade animal, experimentação animal e estatuto dos animais nas leis constitucionais e no direito internacional. As leis de diferentes países são comparadas em cada uma das áreas temáticas. Por exemplo, no capítulo sobre a experimentação animal o livro mostra como os diferentes países têm abordado a experimentação animal por meio de leis nacionais. Só há um único país no mundo (São Marino), que proíbe categoricamente a experimentação animal. Alguns países estão a proibir experiências com os grandes símios, como a Espanha ou a Nova Zelândia. No entanto, a maior parte dos países não proíbe, mas antes regulamenta, o uso de animais em experiências, educação e testes. Leis reguladoras permitem o uso de animais em pesquisa científica e biomédica, mas procuram minimizar o sofrimento através da regulamentação das instalações e da higiene, a instituição de comités de fiscalização, minimizando experiências redundantes, e promovendo métodos alternativos. As leis nacionais dos seguintes países são apresentadas e comparadas: São Marino, Liechtenstein, Nova Zelândia, Reino Unido, Estados Unidos, China, Índia e Austrália.

O capítulo sobre o direito internacional é excepcional, uma vez que não se concentra num assunto em particular, mas discute uma variedade de acordos internacionais. Três documentos internacionais, com três enfoques diferentes, são detalhados no livro: Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas da Fauna e da Flora Selvagens (CITES), restrições comerciais baseadas em bem-estar animal nos termos do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT) e a Convenção Internacional para a Regulação da Actividade Baleeira. Esses tratados, assim como os casos com eles relacionados, mostram claramente a tensão histórica entre a protecção e exploração económica dos animais.

A minha avaliação geral do livro é de que ele fornece uma introdução útil para o Direito Animal e ajuda a compreender as oportunidades para os animais de todo o mundo. O livro também fornece uma visão limitada aos “novos movimentos” no direito animal com vista a melhorar o estatuto dos animais, tais como o Great Apes Project (numa perspectiva de direitos dos animais) ou a Organização Mundial da Saúde Animal (OiE) (numa perspectiva de bem-estar animal).