Novas iniciativas portuguesas na promoção de alternativas à utilização de animais em biomedicina

O tema da experimentação em animais tem vindo a ganhar crescente relevância em Portugal, ainda que esteja longe do nível de controvérsia que se observa noutros países, como o Reino Unido, Suiça ou alguns países escandinavos.

Começam assim a surgir algumas iniciativas para a promoção de alternativas ao uso de animais em biomedicina, com a particularidade de serem da parte de instituições não-académicas, como é a Sociedade Portuguesa para a Educação Humanitária (SPedH) e o Biocant Park.

O primeiro será o workshop “Alternativas à utilização de animais em estudos pré-clinicos”, uma iniciativa do  Biocant Park (Cantanhede, Coimbra), e ao abrigo do projecto europeu ShareBiotech, a realizar a 10 de Dezembro.

Segundo a organização, esta workshop parte da identificação deste tipo de iniciativas como uma das necessidades mais prementes, num questionário dirigido a grupos de investigação. O workshop focar-se-á essencialmente na divulgação de abordagens em estudos pré-clinicos sem o uso de animais, sendo uma oportunidade para a indústria, investigadores e clínicos discutirem e traçarem linhas de acção no sentido de desenvolverem potenciais alternativas ao uso de animais nesta área.

Uma outra iniciativa será o International Conference Of Alternatives to Animal Experimentation, organizada pelo SPedH, e que tomará lugar a 26 e 27 de Janeiro de 2013, em Almada. O programa contará com influentes oradores portugueses e estrangeiros nas áreas da filosofia, da investigação biomédica e até da política. Estão também abertos à submissão de abstracts para posters até 30 de Novembro.

Da minha parte, tenho particular curiosidade neste último evento, nomeadamente no que diz respeito ao “tom” de toda a conferência, dado os organizadores se alinharem próximos da perspectiva dos “direitos dos animais”, e pela qual se regem também alguns dos principais convidados. Terá contudo também a participação de cientistas com diferentes visões, pelo que poderemos ter um interessante e equilibrado debate. 

E porque hoje é dia do animal…

Uma série de iniciativas tem lugar hoje por todo o globo, não sendo Portugal a excepção. De entre as actividades organizadas por autarquias, zoológicos e várias associações, destaco a devolução de vários animais ao habitat natural pelo Centro de Recuperação de Fauna Selvagem do Parque Biológico de Gaia.






Clique na imagem para um programa detalhado da libertação de animais selvagens pelo Centro de 
Recuperação do Parque Biológico de Gaia

A autarquia de Valongo é uma de várias que hoje dedicam um programa especial para comemorar este dia (clique na imagem para mais informações).

O Centro Veterinário Universitário Vasco da Gama abrirá hoje as suas portas para um dia destinado a várias sessões de aconselhamento veterinário, apelando às Associações de Protecção Animal que se juntem a essa acção (clique na imagem para mais informações).

Do negacionismo científico e outras falácias

No que diz respeito ao uso de animais como modelos em ciência, considero a perspectiva abolicionista  como filosoficamente legítima. A mesma deriva de um conceito de direitos animais que, na linha de pensamento de filósofos como Tom Regan, vai pedir “emprestado” ao Kantismo o conceito de dignidade intrínseca e inviolável  dos seres humanos e o “estica” para incluir todos os animais sencientes.
Concordando-se ou não, a honestidade intelectual de Regan a este respeito é inquestionável. O seu apelo à abolição do uso de animais em ciência é indiferente aos eventuais benefícios médicos (ou outros) que possa ter para humanos ou mesmo para outros animais. Estabelecendo um paralelo com o que se passou com a experimentação médica levada a cabo em humanos pelos nazis, Regan argumenta que há fins que em circunstância alguma justificam os meios. 
Já Peter Singer, filósofo utilitarista e o autor mais influente para os adeptos dos direitos dos animais, admite haver circunstâncias nas quais os benefícios da experimentação em animais poderão justificar os custos (para os animais). Ao invés de uma abrupta mudança de direcção ética da parte de quem providenciou as bases filosóficas do actual movimento para a “libertação animal”, é antes o resultado lógico da sua coerência com a filosofia utilitarista que preside à sua obra seminal, Animal Liberation, como já clarificado pelo próprio (que considera tais circunstâncias raras e excepcionais) e comentado por Regan (vide aqui).
Face a estes exemplos de coerência, é difícil de compreender o porquê de muitos apologistas dos direitos dos animais optarem pelo negacionismo científico para argumentar a sua posição. Assim, ao invés de assentarem o cerne da sua argumentação no pressuposto moral que o sofrimento dos animais  nunca é justificável (seguindo Regan), partem para um pseudo-balanço utilitarista entre custo e benefício que está comprometido à partida, ao considerarem que é cientificamente inválido (e inclusive fraudulento) usar animais como modelos de seres humanos, ou mesmo de outros animais.
Ora isto contradiz a evidência do contributo da experimentação animal teve no incrível progresso médico e científico dos últimos 100 anos, e nunca antes visto na história da humanidade (para alguns dos exemplos mais relevantes, ver aqui). A título de exemplo, consideremos que das 102 ocasiões em que Prémios Nobel em Medicina ou Fisiologia foram atribuídos desde 1901, em 81 ocasiões foi para premiar trabalho científico conduzido em vertebrados não-humanos, enquanto que noutras quatro laurearam investigadores que se basearam directamente em resultados obtidos de experiências com animais levadas a cabo por outros grupos. Uma outra medida indirecta do impacto que o progresso biomédico – em larga medida assente na experimentação em animais – teve no século XX é o aumento da esperança média de vida, que em alguns países desenvolvidos duplicou entre 1900 e 2000, continuando ainda a crescer (ver, por exemplo, Oeppen and Vaupel 2002Kirkwood 2008Kinsella and He 2009).
Há, evidentemente, limitações associadas ao uso de cada modelo animal, sendo necessário que os investigadores estejam a par das mesmas, bem como das melhores práticas em bem-estar animal, desenho experimental e métodos alternativos. Mas daí a acusarem os investigadores de “fraude científica”, como frequentemente o fazem activistas  dos direitos dos animais, vai um enorme, e infundado, passo.

O uso de animais assenta no pressuposto evolutivo de todas as espécies vivas partilharem traços fisiológicos, genéticos e comportamentais – entre outros – entre si, uma semelhança tanto maior quanto maior a proximidade filogenética entre as espécies em questão.

Um forte argumento – e o qual partilho – para a necessidade de salvaguardar o bem-estar dos animais é o facto destes, e principalmente os vertebrados, poderem sentir dor, prazer, stress, isolamento, angústia, “depressão” ou “alegria”, de modo análogo aos humanos. Isso deriva de partilharem connosco as estruturas e fisiologia neuroendócrinas – bem como as restantes – necessárias para a manifestação desses estados cognitivos e emocionais, o que por sua vez constitui também um forte argumento científico para a validade do seu uso como modelos em ciência. Assim, optar por apenas ver a parte que legitima o seu ponto de vista, defendendo que os animais “são iguais a nós” e depois ignorar essa semelhança quando se trata de alegar que não podem servir de modelos de seres humanos ou outros animais é uma clara manifestação de negacionismo científico ao serviço da causa animal.

Numa apresentação nas TED conferences, Michael Specter alertou para o perigo que o negacionismo científico, em geral, representa para a sociedade, a qual convido todos os animalogantes a assistir.

“You are not entitled to your own facts”, nas palavras de Specter

Tudo isto vem a propósito da mais recente petição levada a cabo pelo Partido pelos Animais, pela “substituição da experimentação animal por alternativas”.  Aparte a minha enorme curiosidade em saber como se pode alcançar tão ambicioso desígnio por intermédio de petição, interrogo-me também até que ponto as alegações presentes no texto que acompanha a petição são resultado de um – até certo ponto compreensível – enviesamento cognitivo e ideológico, e quanto será fruto de deliberada desonestidade intelectual. 
Ainda que devesse presumir, a priori, boa fé da parte dos membros do dito partido, o(s) cabeçalho(s) em destaque na sua página web [entretanto retiradas mas ainda presentes na página de Facebook do partido, aquiaqui aqui] não me deixam grande margem para lhes outorgar o benefício da dúvida e passo a explicar porquê.

Primeiro, é explorada a ligação afectiva a cães e chimpanzés no sentido de apelar a uma imediata reacção emotiva, “esquecendo-se” que em Portugal não se faz investigação biomédica em nenhuma das duas espécies. Aliás, “esquecem-se” também de dizer que o uso de grandes símios em investigação é proibido em toda a União Europeia. Ignorância ou desonestidade?

Lembro que as mais recentes estatísticas revelaram que o somatório de todos os primatas de todos os tipos constituíram apenas 0,08% do total de animais usados em investigação, sendo o seu bem-estar sujeito a um conjunto de regras e fiscalização rigorosíssimas. Outros mamíferos não-roedores perfizeram  0,05% do total, sendo o seu uso subordinado aos mesmos critérios de exigência. Para esclarecimento da importância dada ao tratamento ético dos animais em investigação, preocupação pelo seu bem-estar, valorização de métodos “alternativos” e relevância da experimentação animal, aconselho uma leitura atenta à mais recente legislação comunitária que regula o uso de animais para fins científicos.
Nestes anúncios não se coíbem de colocar nos potenciais signatários o ónus da responsabilidade pela “tortura, desmembramento e morte lenta e dolorosa de milhares de cães, ratos e macacos”, uma chantagem emocional inaceitável da parte de um partido que almeja respeito e credibilidade. Um enorme tiro no pé político, portanto, para além de uma gravíssima campanha difamatória dirigida à comunidade científica. Sendo tortura entendida como o acto de infligir dor severa com a finalidade de castigar, forçar a obtenção de informação ou simplesmente como acto de crueldade, devia a comunidade científica desafiar publicamente o PAN  a substanciar essa acusação, bem como muitas outras patentes na petição.
Quanto ao texto da petição em si, não conseguiria fazer uma análise detalhada a todas as incongruências, meias-verdades e falsidades aí presentes, sem estender em demasia o tamanho deste post. Por isso reservo-os para os comentários. 

Porque é importante medir a dor em murganhos? – Entrevista a Matthew Leach

No seguimento do nosso último post, apresentamos uma entrevista ao primeiro autor do recente artigo The Assessment of Post-Vasectomy Pain in Mice Using Behaviour and the Mouse Grimace Scale, Matthew Leach, da Universidade de Newcastle (tradução por Nuno Franco). 

Matthew Leach, 2012


Anna Olsson – Olá Matt. Antes de mais parabéns pelo teu artigo recentemente publicado na PLoS One. Neste artigo vocês comparam diferentes métodos de avaliar a dor em murganhos.  Podias por favor descrever brevemente como este trabalho foi realizado?

Matthew Leach – Neste estudo nós comparamos as mudanças nas expressões faciais de murganhos usando a Mouse Grimace Scale (MGS) [1] com outros métodos validados de avaliação de dor baseados no comportamento dos animais. Neste caso, os animais avaliados foram murganhos [ratinhos] macho sujeitos a vasectomiade rotina [2]. Para isso foram recolhidos vídeos do comportamento dos animais um dia antes e uma hora após a cirurgia, tendo sido usadas imagens estáticas retiradas dessas gravações para a avaliação com base na MGS.

Os animais foram divididos em três grupos, um tendo recebido solução salina [grupo controlo], outro meloxicam,e outro bupivacaína [3], administradas 30 minutos antes da cirurgia. Foi estabelecido que, se necessário, os animais receberiam ainda analgesia de intervenção, no pós-operatório



A.O. – Quais foram as principais conclusões?

M.L. – Fomos capazes de detectar e avaliar a dor após vasectomia em murganhos através da MGS, tendo-se registado entre os momentos pré e pós-cirurgia um aumento significativo na classificação com este método. Através da MGS, foi também possível aferir a eficácia do uso de analgésicos, que se reflectiu numa menor classificação MGS após a vasectomia nos grupos que a receberam.  Observamos ainda que a MGS foi tão eficaz na avaliação da dor pós-vasectomia e eficácia analgésica em murganhos como  métodos de avaliação comportamental validados.

    A.O. – Porque, e para quem, é isto é importante?

    M.L. – Nós pensamos que o desenvolvimento de melhores métodos para avaliação e alívio da dor em animais, e murganhos em particular, é crucial. Presentemente sabemos muito pouco sobre o modo como avaliar e aliviar a dor induzida por procedimentos rotineiramente realizados nestes animais. A identificação e redução da dor em animais usados em investigação não só é importante para o seu bem-estar, mas também para a validade dos dados recolhidos desses animais.

    A MGS parece oferecer um meio simples e rápido de avaliar dor pós-cirúrgica em murganhos, e que supera algumas das limitações associadas aos métodos actualmente utilizados com base em indicadores comportamentais


    Nós esperamos que este método seja utilizado por todos aqueles de alguma maneira responsáveis pela avaliação de dor em murganhos, sejam eles veterinários, técnicos, tratadores ou os próprios investigadores que usem murganhos nos seus estudos. 
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    [1] N.T. – A Mouse Grimace Scale é uma escala desenvolvida para interpretação e avaliação de “expressões faciais” em murganhos, e já apresentada neste blog

    [2] N.T. – A vasectomia de murganhos é usada para implantação de embriões em fêmeas. Após a cópula, e uma vez que os machos são estéreis, as fêmeas ficam num estado de “pseudo-gravidez” e assim prontas para receberem os embriões a implantar. O uso estes animais é eticamente relevante, pois significa que nenhum foi submetido a intervenções dolorosas como resultado directo deste estudo, mas antes foram usados animais que seriam, de qualquer maneira, intervencionados para um programa de modificação genética. 

    [3] Analgésicos frequentemente utilizados

    A moral, segundo a maioria

    Ontem, pelas 18h, a Associação Académica da UTAD (minha alma mater) organizou uma reunião geral de alunos para levar novamente a votos a organização da Garraiada durante a Semana Académica, actividade que fez parte do cartaz deste evento durante cerca de vinte anos, até que foi pela primeira vez interrompida em 2009.

    Cartaz a convocar os alunos para a RGA deste ano
    para votar a realização das garraiadas

    Essa primeira interrupção resultou da primeira RGA convocada ad hoc para debate desta questão, tendo nessa primeira edição a maioria dos alunos presentes decidido pela abolição das garraiadas.
    Foi uma abolição que pouco durou, uma vez que em 2011, e novamente por decisão da maioria dos alunos presentes em RGA, a garraiada voltou às comemorações da Semana Académica, mas não sem polémica.

    O debate acesso levou a AAUTAD a nova convocação de RGA este ano, que resultou na aprovação da realização deste evento na Queima 2012, por 120 votos contra 80. 

    Mas o que é a garraida? Antes de mais, convém salientar que é diferente de uma tourada, uma vez que o animal não é toureado ou bandarilhado. Assemelha-se mais à pega pelos forcados que vemos nas arenas portuguesas. Um vitelo (ou uma vaca) é libertado na arena e cabe a um grupo de meia-dúzia de voluntários – muitas vezes embriagados – tentar conter o animal. Na UTAD, há ainda um grupo supostamente cómico – “Los Papa Vacas” – que faz “sketchs” nos quais o animal é “convidado” a integrar como personagem de destaque (mais ou menos na linha dos rodeo clowns). Apesar de menos violenta que a tourada, na garraiada o tipicamente dócil animal é espicaçado, cercado, empurrado e puxado pela cauda e cabeça, podendo sofrer luxações, fracturas e até morrer na arena (como chegou a acontecer há poucos anos na UTAD) como consequência de trauma infligido. Não é também de menosprezar o stress a que é submetido.

    Garraiada na UTAD

    Ainda que seja de louvar a atitude da AAUTAD de manter uma posição neutra e sondar os alunos, não é menos verdade que os 200 alunos presentes na última RGA (e foi a mais participada) não sejam representativos de uma universidade com 6.000 alunos, os quais vão em massa para  actividades da semana académica como a serenata ou os concertos à noite, mas que não costumam ser tão adeptos de assistir à garraiada, tipicamente organizada por e para alunos das ciências agrárias (Medicina Veterinária, Zootecnia, Agronomia).

    Ao contrário da AAUTAD, não sou isento nesta matéria e, ainda que não possa votar, não deixei de dar a minha opinião das redes sociais, onde este foi o tema em destaque entre alunos da universidade, por estes dias.

    Do ponto de vista custo/benefício, e ainda que o custo para o jovem animal (se não houver acidentes, algo impossível de garantir) possa não ser tão grande como o presenciado nas touradas, o inexistente benefício proveniente das garraiadas desde logo leva a que as considere condenáveis. Também julgo ser uma actividade que veicule valores de desrespeito pelos animais, não contribuindo assim para a formação ética e cívica dos jovens alunos da universidade.

    A ética contratualista assenta no pressuposto que a moralidade se baseia no consenso. Não creio ser este o caso, já que quando se leva uma questão moral a votação, não ganha o consenso nem o compromisso, mas sim a maioria. Ainda que o processo democrático seja de valorizar, será legítimo deixarmos a “maioria” (neste caso concreto, nem sabemos ao certo o que a maioria dos alunos pensa) decidir o que é ou não moralmente aceitável, principalmente quando a opinião não resulta de reflexão ética isenta, informada e precedida de debate aberto a todos os pontos de vista?

    Quer passear no fim-de-semana? Vá de burro!

    A Associação para o Estudo e Protecção do Gado Asinino (AEPGA) promove, de 30 de Abril a 1 de Março, mais uma edição do passeio de burro intitulado  “Por Terras D L Rei“. 


    É uma excelente oportunidade para conhecer melhor a raça asinina de Miranda, as belíssimas paisagens do Nordeste Transmontano e passar um fim-de-semana tradicional sozinho, com amigos ou em família (há actividades específicas para crianças). Pode consultar o programa aqui.

    A AEPGA dedica-se à protecção e promoção do Gado Asinino, em particular da raça autóctone das Terras de Miranda, o “Burro de Miranda”. A associação reúne criadores e admiradores destes burros e contribui para o melhoramento genético e criação de um conjunto de animais de características semelhantes no Planalto Mirandês, representando a primeira raça autóctone de asininos de Portugal. Saiba mais aqui.

    Formação de técnicos de animais de laboratório

    A profissão de tratador de animais de laboratório foi durante muito tempo tida em pouca consideração no nosso país. Contudo, o papel dos tratadores como importantes intervenientes na qualidade da investigação e no bem-estar animal não pode ser negligenciado.  
    Os primeiros cursos de formação para pessoas que cuidam e manuseiam animais de laboratório apareceram em Portugal em 2011. No entanto, o novo curso para técnicos de animais de laboratório, agora divulgado pela Sociedade Portuguesa de Ciência em Animais de Laboratório e a Faculdade de Medicina Veterinária em Lisboa representa, mais que uma mera iniciativa pontual, um projecto de  formação contínua destes profissionais.
    Ainda que a ausência destes cursos não seja sinónimo de falta de conhecimento, a aposta na formação destes profissionais representa um passo inequívoco no sentido do desenvolvimento e valorização desta profissão, algo absolutamente central para a qualidade da investigação e para o bem-estar dos animais usados em investigação. 
    São os tratadores e técnicos quem diariamente lida e manuseia os animais. A capacidade para reconhecerem problemas de bem-estar é, assim, da maior importância. Mas isto não  basta. É ainda preciso que o tratador tenha suficiente confiança na sua própria capacidade profissional para que sinta legitimidade e à-vontade para alertar o investigador ou médico veterinário responsável de eventuais problemas. 
     

    Para mais informação sobre o curso em questão, contactar Teresa Inácio, Gabinete de Formação Contínua da Faculdade de Medicina Veterinária tbaltazar@fmv.utl.pt.

    O CNECV pronuncia-se sobre a Ética da Experimentação Animal

    O Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida emitiu recentemente o parecer 62/CNECV/2011, relativo aos aspectos éticos da Experimentação Animal. Foi com surpresa que tomei conhecimento do mesmo, uma vez que constitui um desvio da habitual linha de intervenção deste organismo, habitualmente dedicado à avaliação dos desafios e riscos apresentados por novos desenvolvimentos médicos e biotecnológicos para a sobrevivência, segurança e dignidade humanas, uma abordagem na linha do conceito de Bioética proposto  por V.R. Potter (1970) (que mais tarde a ampliou), ainda enraizada na Ética Médica clássica.

    Tendo a experimentação animal por objectivo o benefício da humanidade e estando os “custos éticos” deslocalizados para outras espécies – habitualmente fora da esfera de consideração do CNECV –  tem este parecer especial relevância, uma vez que, a par com o anterior parecer acerca da biologia sintética, vem alargar a esfera de intervenção do CNECV para outros domínios da “nova” bioética, que abarcam dilemas éticos noutros ramos das Ciências da Vida com consequências ambientais e sociais, como a Ética Animal.

    Segundo o CNECV, este parecer foi suscitado pela “crescente consciencialização da generalidade dos cidadãos acerca do valor de que se revestem todas as suas formas de vida e especificamente a vida animal, bem como da responsabilidade que assiste à sociedade na sua protecção“. É ainda reconhecida a pertinência deste parecer, no contexto da publicação da Resolução da AR n.º 96/2010 para criação de uma rede nacional de biotérios e promoção dos 3Rs; e do actual momento, em que Portugal se prepara para transcrever para a legislação nacional a Directiva Europeia que regula o uso de animais para fins científicos.  

    Parte assim este documento, à primeira vista, de uma motivação contratualista de obrigação para com os interesses da sociedade (humana!) no tema, mais do que por um sentido de obrigação moral para com os animais; algo perfeitamente legítimo, até considerando as habituais competências do CNECV. Contudo, a apreciação do problema ético deixa transparecer uma consideração pelos interesses dos próprios animais.

    Murganho com um gene que afecta o crescimento do pêlo
    suprimido (esq.) junto a um congénere  normal (Fonte)

    A justificação da experimentação animal é desde logo reconhecida na nota introdutória, sendo este uso de animais referido como o “que suscita mais e melhores argumentos para manter inalterável um amplo e fácil acesso à utilização de animais”. No entanto, consideram ser também o que, “em termos gerais, pode causar mais elevados níveis de dor, sofrimento, desconforto, prejuízo e eliminação de animais”. 

    Estas são, na minha opinião, concepções erróneas do actual uso de animais em biomedicina. Por um lado, não creio que a experimentação em animais seja sempre  justificável, nem considero que dar “amplo e fácil acesso” ao uso de animais seja uma política que conduza a uma eficaz implementação dos 3Rs. Por outro lado, muitas  outras actividades humanas obrigam a grande ou prolongado sofrimento dos animais – como a produção intensiva de animais para consumo, ou a lide taurina, entre outros – ao passo que muitos estudos em animais não implicam stress ou sofrimento relevante. Mesmo em  estudos em doenças severas, a implementação de boas práticas de bem-estar pode reduzir consideravelmente o sofrimento dos animais (por vezes ao ponto de não haver sofrimento) e proporcionar melhores condições de vida. Deve-se admitir, contudo, que falta conseguir que essas práticas sejam reconhecidas e implementadas universalmente. 
    O documento faz uma breve (e, compreensivelmente, um pouco simplista) resenha histórica do uso de animais como fonte de conhecimento biomédico, da antiguidade até aos dias de hoje, fazendo referência aos movimentos de contestação ao uso de animais e aos primeiros esforços legislativos para a regulamentar. De salientar o facto da manipulação genética surgir como questão eticamente relevante, ainda que não seja assumida uma posição clara para esta questão. 
    Mais interessante é a parte dedicada ao contexto socio-político da investigação em Portugal e ao “atraso” do país relativamente à regulamentação e ética da experimentação animal. Este atraso é apresentado como uma oportunidade para “experimentar vias de execução [da nova legislação] que assegurem o bem-estar dos animais que não terão necessariamente que ser rígidas e abrangerem todo o território nacional, mas que podem começar com experiências piloto com a participação, por exemplo, das universidades ou dos Laboratórios Associados” uma proposta que, confesso, não compreendi de todo. 
    A problematização ética é de seguida apresentada com clareza, resumida como sendo um conflito entre “o bem-estar dos animais e os benefícios decorrentes da prossecução da investigação científica”. À clássica visão antropocêntrica que vê animais como meios através dos quais os humanos alcançam fins, e não como fins em si mesmos, é contraposta  a filosofia utilitarista de Jeremy Bentham (séc. XVIII), que coloca os animais como merecedores de consideração moral pela sua capacidade de poder sofrer e sentir prazer. É ainda perspectivada a visão (no parecer denominada como “zoocêntrica”, um termo que consideramos não ser apropriado) dos contemporâneos e influentes filósofos Tom Regan e Peter Singer que, não obstante as suas diferenças, apontam para um valor da vida animal que não depende da consideração humana, sendo-lhe intrínseca.  Perante este  conflito entre a necessidade da investigação científica e a protecção dos animais, “realidades distintas, mas ambas percepcionadas como um bem e um valor em si mesmo“, coloca o Conselho como questão prática a necessidade de encontrar um equilíbrio entre estes dois valores
    Sem surpresas, os 3Rs de Bill Russell e Rex Burch são apresentados como um compromisso entre estes dois valores e um caminho para o progresso melhorar o bem-estar animal e diminuir o número de animais utilizados, realçando-se o papel preponderante destes princípios na idealização da recente Directiva Europeia (2010/63/UE), da qual descrevem os pontos mais relevantes e reformistas, principalmente para Portugal, consideravelmente atrasado na legislação, regulamentação e supervisão do uso de animais em ciência.

    Uma representação do papel dos 3Rs na melhoria do paradigma da experimentação animal
    (Fonte: FRAME)
    Algo que diferencia documento de outros semelhantes é a análise de alguns pontos da Directiva 2010/63/EU à luz de questões relevantes na ética médica, a qual, sem dúvida, é a área de maior relevância para este organismo. Assim, é realçado o contraste entre a inclusão de animais no último terço do tempo da gestação no âmbito da regulamentação da directiva e a crescente liberalização do aborto, que constituiu uma menor protecção da vida embrionária humana*. Também a crescente restrição ao uso de  animais merece critica do CNECV, caso a procura por alternativas levar a um aumento do uso de células estaminais germinais embrionárias humanas, que levanta questões éticas específicas.

    * A mais recente legislação portuguesa (de 2007) permite a interrupção voluntária da gravidez por escolha da mulher apenas até às 12 semanas, e em caso de malformação grave até às 24 semanas, estando a partir daí  (o que inclui o 3º trimestre) todos os fetos viáveis protegidos por lei. Ademais, a directiva não proíbe o uso de formas fetais, mas apenas inclui estas na sua regulamentação. O comentário exposto pela CNECV, assim, parece ser mais uma constatação, em abstracto, do existente contraste entre a crescente protecção da vida pré-natal animal, face à diminuição dessa protecção nos fetos humanos. 

    Quanto ao parecer emitido propriamente dito, o mesmo aponta, na generalidade, para a necessidade de uma rápida e eficaz transposição da Directiva 2010/63/EU e dos princípios dos 3Rs consagrados na mesma, propondo algumas medidas que agilizem a sua efectiva aplicação na prática. Sugerem acções do tipo “hard power”, nomeadamente uma maior supervisão e fiscalização de todos os  intervenientes no uso de animais em ciência (prevendo sanções a quem não cumpra a regulamentação) e a recusa de financiamento a quem não der garantias de boas práticas. Como medidas de “soft power”, sugerem a promoção de melhores práticas através de formação para os 3Rs, informar os investigadores sobre a legislação mais recente e consciencializá-los para os aspectos éticos do seu trabalho. 
    Estas propostas, em termos gerais, não trazem nada que não esteja já contemplado pela actual legislação europeia, ou que não seja já uma prática corrente nos centros de investigação europeus com melhores padrões de bem-estar animal e que em alguns institutos de excelência em Portugal se tem procurado seguir. Este documento, contudo, vem dar uma voz credível e influente à mudança que urge implementar no país a respeito do bem-estar de animais de laboratório e mais legitimidade aos membros da comunidade científica em Portugal que, através da sua actividade, têm procurado ser agentes activos dessa mesma mudança. 

    A fundação da Sociedade da Declaração de Basileia (Parte III)

    Embaixada Suiça em Berlim

    Ver Parte I e Parte II desta notícia.

    O evento principal desta conferência foi a formação de grupos de trabalho para abordar questões específicas, de modo a redigir textos que servissem de referência a cientistas que pretendam adoptar os princípios da declaração de Basileia. Cada uma destas declarações foi levada a apreciação e votação em plenário, incluindo aquela em que participei (“Avaliação de Severidade”). Esta apreciação em plenário  levou à revisão de cada declaração de modo a torná-las mais claras, concisas, relevantes e de aplicação mais fácil e mais universal (a Declaração é de carácter global, não se restringindo ao espaço europeu).   Na manhã seguinte, cada um deles foi apresentado aos media em conferência de imprensa na Embaixada Suiça (onde, aliás, tinha decorrido o jantar da noite anterior, no qual fomos recebidos pelo embaixador). As declarações disseram respeito aos seguintes tópicos:

    Transparência e Publicação –  Como parte integrante da sociedade, têm os cientistas a responsabilidade de divulgar os avanços científicos ao público, sendo o diálogo aberto entre as duas partes a base para a confiança na ciência. Todos os resultados (positivos, negativos e inconclusivos) obtidos de acordo com as boas práticas científicas são importantes e a sua publicação permite evitar duplicação não-intencional de experiências. Uma vez que cientistas publicam em revistas especializadas e em jargão técnico, devem comunicar também de modo acessível ao público, devendo esta ser uma política explícita em institutos de investigação e universidades. 

    Os 3Rs – É ressalvada a importância dos 3Rs que são, aliás, parte integral da investigação feita em  ciências da vida. Este texto urge os cientistas a comprometerem-se no avanço do conhecimento, divulgação e implementação dos 3Rs, apresentando algumas medidas para a consecução desse objectivo. 

    É cientificamente justificável classificar 
    a priori a modificação genética como 

    “severa”, se não resulta em mal-estar?

    Classificação da Severidade –  A avaliação contínua dos animais é essencial para aferir o impacto dos procedimentos nos animais e para uma melhor definição e aplicação dos “humane endpoints”, razão pela qual é recomendada inclusive a cientistas a quem tal não é exigido nos seus países. São ainda avançadas  propostas para a classificação da severidade que não estão contempladas na directiva 2010/63 ou na legislação de outros países não-comunitários. 

    Educação e formação – Para além do treino em manuseamento dos animais, a formação contínua em tópicos como desenho experimental, ética ou pesquisa em bases de dados – bem como a certificação dos cientistas nestes domínios – são também essenciais para a melhor  implementação dos 3Rs, devendo haver esforços no sentido de harmonizar quer as competências necessárias, quer os critérios que as definem. 

    Comunicação com o público – Sendo este o ponto mais crucial na Declaração de Basileia, o tema foi de novo alvo de reflexão, tendo sido apresentadas novas propostas concretas para melhorar a comunicação entre comunidade científica e população, algo cuja responsabilidade deve recair não só nas instituições, mas também nos cientistas ao nível individual. Urge também a criação de organizações de âmbito nacional para o efeito. 

    Face a esta Declaração, e aos desenvolvimentos decorrentes, levantam-se algumas questões: 

    • Devem os institutos/universidades portugueses subscrevê-la e seguir as suas recomendações? 
    • Quais os benefícios?
    • Quais as desvantagens? 
    • Que obstáculos tem as nossas instituições (políticos, económicos, culturais, de formação…) para a  consecução dos objectivos que propõem a Declaração de Basileia? 

    A fundação da Sociedade da Declaração de Basileia (Parte II)

    O tema da conferência Pathway to more Transparency in Animal Research reveste-se da maior importância para o público e legisladores, sendo também o ponto mais crucial da Declaração de Basileia. A escolha da Alemanha para esta conferência revestiu-se de especial significado, uma vez que foi o único país que se absteve de aprovar a nova directiva comunitária que regula o uso de animais em ciência, como faz questão de salientar a Nature deste mês. 
    Sendo a Declaração uma iniciativa de (e para) cientistas, e dadas as circunstâncias que a incentivaram, não me estranharia que o tom desta conferência fosse o de um apelo à união da comunidade científica “contra” os seus “adversários”. Contudo, ao longo das sessões da manhã, no decorrer dos grupos de trabalho e no plenário final, era fácil de constatar que a preocupação pela elevação dos padrões de bem-estar animal e do aumento da transparência na comunicação do uso de animais é não só genuína como também encarada como o melhor caminho para a credibilização da comunidade científica. 

    Prof. Stefan Treue
    Isto ficou logo patente no discurso de boas-vindas do Prof. Stefan Treue, director do German Primate Centre e uma voz crítica do  clima de restrição ao uso de primatas que se viveu na Europa (mais por razões políticas que científicas) e do qual foram exemplos os primeiros esboços da proposta de directiva, altamente penalizadora da ciência (e entretanto refinada, graças aos esforços de investigadores na indústria e academia) e o chumbo de propostas de investigação em primatas na Alemanha Suiça (com base na “falta de aplicabilidade directa” dos estudos). Treue salientou a importância da formação dos cientistas para a consecução dos objectivos de Basileia e relembrou o risco inerente na divisão, sempre falaciosa, da investigação biomédica em “básica” e “aplicada”. Até porque há a percepção, da parte de políticos, entidades financiadoras e do público que esta divisão seja do tipo investigação “má/boa”, “desnecessária/útil”, “rentável/desperdício”. 

    Prof. G. Heldmaier
    De seguida, o Prof. Gerhard Heldmaier, na sua apresentação “Tranparency: Risk or opportunity” fez questão de destacar  a transparência como o principal pilar da Declaração de Basileia, sendo que a mesma se deveria reflectir quer na comunicação entre a comunidade científica, quer na comunicação com o público. 
    Prof. Richard Bianco
    Esta transparência, contudo, na perspectiva do Prof. Richard Bianco (University of Minnesota) ainda que algo  muito positivo, não deveria equivaler a ingenuidade. Bianco, que apresentou a sua “Transatlantic Perspective on the Basel Declaration – The 3Rs in experimental surgery”, ilustrou-o com o seu caso pessoal, já que a mesma apresentação nos EUA não seria possível sem a presença da  polícia no auditório, pois já tivera sido ameaçado de morte duas vezes. Acontece frequentemente que a informação fornecida por institutos e universidades – ao abrigo de políticas como o Freedom of Information Act do Reino Unido –  seja apresentada por activistas de modo descontextualizado e usada para atacar essas instituições. Isto poderá acontecer  porque uma parte considerável da população não estabelece imediatamente a ligação entre os avanços médicos dos quais beneficia e a investigação em animais que leva a esses avanços, sendo assim vulneráveis à manipulação por activistas da causa animal, sem perceber as consequências que o fim do uso de modelos animais acarretaria. Não obstante, os cientistas consideram as políticas de transparência benéficas, dado  o seu potencial para esclarecer o público das razões que motivam o uso de animais em biomedicina, algo que para a maioria da população legitima essa prática (ver dados do Eurobarómetro). 

    Bianco apresentou o trabalho da sua universidade em modelos animais de procedimentos cirúrgicos em cardiologia – que deram origem a tecnologias e terapias com aplicação na medicina humana e veterinária –  salientando, contudo, a importância dos métodos não-animais como modo de preparar e reavaliar os testes em animais e humanos. Fez também um apelo à pro-actividade da comunidade científica, que frequentemente apenas age em reacção aos ataques de activistas, propondo ainda que se repensasse o uso do termo “experimentação animal”, já que “when the methodology becomes the focus, many research disciplines can be targeted as controversial“, proposta que teve eco  no trabalho desenvolvido nesse dia. 

    Susanna Louhimies
    De seguida, a Dr. Susanna Louhimies veio dar a perspectiva da União Europeia relativamente à Declaração de Basileia, face à nova legislação comunitária. Foi com surpresa que a ouvi dizer que o objectivo último da Directiva é a total substituição do uso de modelos animais, algo que reconheceu não se vislumbrar possível, neste momento. Louhimies alinhou os objectivos da declaração de Basileia com os da Directiva, nomeadamente a elevação dos padrões de bem-estar animal, do aumento da transparência e da promoção dos 3Rs. Deu ainda ênfase à necessidade da avaliação do impacto nos animais antes, durante e depois do decorrer dos estudos, bem como da obrigatoriedade de aplicação de refinamento não só nos procedimentos, mas também no alojamento e manutenção dos animais. No final, apelou a investigadores e activistas pelos direitos dos animais a verem a nova legislação como uma oportunidade para trabalharem em conjunto para melhorar o bem-estar animal. 

    Prof. Michael Hengartner,
    no encerramento da sessão da manhã
    A apresentação oficial da Basel Declaration Society –  constituída legalmente três semanas antes do evento – ficou a cargo do Prof. Michael Hengartner. Hengartner fez um apanhado do progresso efectuado no último ano (constante no relatório anual), e deu a conhecer a publicação “Mice times”, uma publicação bianual gratuita que é publicada desde a Declaração de Basileia (primeirasegunda e terceira edições já disponíveis), sendo uma iniciativa conjunta desta organização e da associação Forschung für Leben. Esta publicação dedica-se a divulgar avanços terapêuticos e no conhecimento em medicina com base em investigação em modelos animais. No final,  constatou que “a year ago we were asked how a piece of paper was supposed to change practices but today we can show that the declaration is a living commitment“.