Curso comportamento e bem-estar de ruminantes

Voltamos a lembrar do Curso em Comportamento e Bem-estar de Ruminantes a decorrer na Faculdade de Medicina Veterinária em Lisboa.

Organizado por George Stilwell, reúne especialistas nacionais e internacionais na área. Poucos combinam investigação da mais alta qualidade científica com preocupação prática neste campo como Jeff Rushen e Anne-Marie de Passillé. Aprender com eles é uma oportunidade a não perder para quem trabalha com gado de produção.

Dia 13 de Maio na Faculdade de Medicina Veterinária.
Inscrições (20 euros, 5 para estudantes) através de tbaltazar@fmv.utl.pt

Produzir bem é estar bem… ou não?

A maioria dos cientistas em bem-estar animal diria que a produção não é um parâmetro fidedigno para se aferir o bem-estar. Mas muitos agricultores e engenheiros zootécnicos diriam, por outro lado, que um animal que produz bem é também um animal que está bem. Em geral, é verdade que um animal acometido pela doença não será o mais produtivo mas, para além deste facto, a relação entre produtividade e bem-estar está longe de ser linear. Isto fica claramente ilustrado num interessante e importante estudo que relaciona a saúde podal de vacas leiteiras e a produtividade, publicado na revista Animal Welfare 04/2010.

Uma equipa conjunta da Universidade Austral de Chile e da Warwick University no Reino Unido treinou produtores de gado leiteiro a usar um sistema padronizado de detecção de laminites (inflamações do casco que provocam claudicação) e a identificar a patologia podal por detrás da claudicação. Sempre que uma vaca manca era identificada, ela era tratada para o problema específico. Sete explorações e 1.635 vacas foram incluídas no estudo. No final, correlacionaram-se os dados sobre a saúde podal com os dados sobre a produção de leite de cada vaca.

 
Para todas as causas de claudicação, a produção de leite aumentou no mês após o tratamento. Para algumas das anteriores houve também uma redução significativa na produção durante alguns meses antes do tratamento, como ilustra o diagrama (que pode ser visto em formato maior clicando sobre a figura).

Mas para uma das patologias podais, dupla sola, as vacas que foram diagnosticadas com o problema apresentaram maior produção de leite antes da sintomatologia do que as vacas sem claudicações. E para outra patologia, a dermatite digital, as vacas coxas produziram mais leite – mesmo sofrendo da doença não tratada – do que aquelas que não apresentaram claudicações.
 
O que é que isto nos diz? Em primeiro lugar – e este é provavelmente o achado mais importante do estudo – que vale a pena aos agricultores estar atentos às vacas coxas e tratá-las atempadamente já que, em geral, a produção diminui quando a vaca claudica e volta a aumentar após o tratamento. Em segundo lugar, que seria benéfico tanto para os agricultores como para as vacas se os problemas fossem detectados mais cedo. As vacas foram tratadas logo que o problema foi detectado, mas, como mostra a figura, a produção já vinha diminuindo durante os meses anteriores, sugerindo que os animais poderiam ter problemas podais muito antes de estes serem detectados. Em terceiro lugar, que a relação entre produção e saúde / bem-estar é complexa. Ao nível individual, a produção parece, de facto, reflectir a saúde: à medida que uma vaca desenvolvia patologias nos seus cascos, a produção de leite descia. Mas ao nível colectivo esta relação não é clara. Por um lado, as vacas de alto rendimento parecem estar em maior risco de desenvolver patologias podais (como já havia sido determinado noutros estudos). Por outro lado, vacas com dermatite digital mantiveram-se mais produtivas do que as vacas não coxas mesmo quando a patologia não estava ainda a ser tratada.
Assim, quando o agricultor observa que uma vaca diminui inesperadamente a produção de um mês para o outro, há todas as razões para suspeitar que a sua saúde e bem-estar estão afectados. Mas o facto de uma vaca produzir mais do que a média não pode ser usado como prova de que ela é saudável e de que goza de bem-estar.Listen
Read phonetically

Temple Grandin – The woman who thinks like a cow

Recomendo a todos o filme do realizador Mick Jackson (2010) sobre Temple Grandin, autista e um dos maiores especialistas mundiais em bem-estar de animais de produção.

O filme ganhou 7 Grammys, incluindo o de melhor actriz para Claire Danes, pela sua convincente interpretação de Temple. A história de Temple tem o condão e nos emocionar e nos fazer pensar na forma como é importante olharmos os animais não através dos códigos humanos mas sim através da linguagem própria de cada espécie. É um desafio à abordagem antropomórfica, muitas vezes dominante, de lidar com os animais.

Vejam também o documentário da BBC: Temple Grandin – The Woman Who Thinks Like a Cow, que aborda a fundo o problema do autismo. Se só quiserem saber sobre o trabalho de Grandin com animais, passem directamente para a parte 4.