A mais recente contribuição da Ordem dos Médicos para a actual discussão política sobre a legalização da eutanásia foi afirmar que não se envolveriam de maneira alguma no processo. Obviamente, a discussão sobre a eutanásia na medicina humana está fora do âmbito deste blog, e o Animalogos não é o lugar certo para partilhar as minhas ideias pessoais sobre algo que não faz parte da minha consideração profissional. Mas o que posso fazer como cientista é procurar e partihar informação científica com relevância para a discussão. Assim, aproveitarei a oportunidade para partilhar um artigo que é tanto relevante como desconhecido, neste contexto.

O artigo, publicado no Journal of Medical Ethics em 2010, relata os resultados de um questionário feito a veterinários suecos em 2008. Faz parte de um corpo maior de trabalho sobre as atitudes acerca do suicídio medicamente assistido por dois dos co-autores, Lindblad e Lynöe, que também inclui sondagens a médicos e ao público geral, na Suécia. Para contextualizar, convém dizer que na Suécia, ao nível político, a discussão sobre eutanásia está ainda numa fase anterior comparado com Portugal: em outubro de 2019 o parlamento decidiu iniciar uma investigação sobre uma eventual implementação legislativa; desconheço o estado atual desta investigação. Portanto, a investigação feita 10 anos antes não surge num ambiente de debate na sociedade sobre o tema.
Por que estariam interessados os especialistas em ética médica no que os veterinários pensam sobre o suicídio medicamente assistido na medicina humana? Esse interesse tem a ver com o argumento às vezes apresentado pelos médicos de que “médicos menos experientes e o público em geral não sabem o que realmente estamos a discutir ao lidar com questões de fim da vida”. Mas, contrariamente aos médicos da Suécia, onde a eutanásia é ilegal, os veterinários realizam regularmente a eutanásia ativa como parte da sua prática profissional. Portanto, pode-se argumentar que um veterinário, pelo menos até certo ponto, saberá mais sobre eutanásia do que um médico.
Talvez inesperadamente, verificou-se que a atitude dos veterinários em relação ao suicídio assistido por médicos é comparável ao do público em geral e não à dos médicos.

Os autores concluem que “De forma semelhante ao público geral, a maioria dos veterinários suecos é a favor do SMA. Como médicos veterinários têm uma longa experiência na prática da eutanásia em animais, será difícil afirmar que não entenderão o que significa prestar SMA a pedido de um paciente terminal e competente. Consequentemente, é difícil sustentar que o conhecimento sobre SMA e eutanásia está inequivocamente associado a uma atitude restritiva em relação a essas medidas”.