A 21 de Junho de 2018, foi lançado em Portugal o Acordo de Transparência sobre a Experimentação Animal. Os então 16, agora 18, signatários do Acordo de Transparência Português concordam em:
- Colocar uma declaração referente ao bem-estar animal no website da Instituição.
- Colocar um link para o Acordo de Transparência.
- Fornecer informações adequadas aos meios de comunicação social e ao público em geral sobre as condições em que é efetuada a investigação com animais e os resultados obtidos.
- Desenvolver iniciativas que promovam maior conhecimento e compreensão da sociedade sobre o uso de animais em investigação científica.
- Reportar anualmente os progressos obtidos e partilhar experiências.
Com esta mudança, Portugal tornou-se o quarto país europeu com um acordo formal para comunicar mais abertamente sobre a experimentação animal, depois do Reino Unido, Bélgica e Espanha. Esta é uma iniciativa bem-vinda e, se for bem-sucedida, como espero, avançaremos para um clima de discussão em que os cientistas possam falar abertamente sobre o facto de usarem animais em investigação biomédica e fundamental.
Mas o que isto implica em termos de papéis e responsabilidades não é óbvio. Que signifique que precisamos de conversar sobre como os animais são tratados é óbvio para mim, como investigadora em bem-estar de animais de laboratório e profissional envolvida em várias medidas institucionais para promover um uso responsável dos animais em investigação, como a revisão de projectos com animais ou a formação em ciência de animais de laboratório para investigadores. E fico feliz em assumir minha responsabilidade na comunicação e falar sobre estes assuntos. Na verdade, já faço isso. Sempre que questionada pelos media, comento, escrevi regularmente durante quase uma década no Animalogos e também escrevi artigos de opinião nos principais jornais.
Ao olhar para o último link, para um artigo de opinião publicado em 2015, juntamente com três colegas, percebo que abrimos com um argumento que pessoalmente não acho que deva ser meu: a utilidade da investigação com animais. Não porque eu duvide que a experimentação animal permite uma compreensão útil dos mecanismos biológicos, mas porque acho que essa é uma mensagem que deve ser comunicada por quem usa animais em ciência. Essa é a responsabilidade dos meus colegas que investigam nas áreas da neurociência, biomateriais, imunologia e infecção, divisão celular e cancro.
E aqui está um verdadeiro desafio para os promotores oficiais da iniciativa, a Sociedade Portuguesa de Ciências em Animais de Laboratório (SPCAL). Esta associação reúne principalmente profissionais envolvidos no cuidado de animais e no aconselhamento de investigadores que usam animais. Estes profissionais já assumem uma enorme responsabilidade ao trabalhar no sentido de uma investigação com animais mais responsável. Não é justo também dar-lhes a responsabilidade de comunicar o porquê dessa investigação ser importante!
Concordo contigo, mas há aqui um “mas”. De facto, não deveriam ter que ser as pessoas que prestam cuidados aos animais – os veterinários, técnicos, tratadores e membros dos ORBEA – a ter que vir dar a cara pela experimentação animal, pelo menos no que diz respeito à sua necessidade para o progresso científico e biomédico. Contudo, somos nós quem tem uma visão mais abrangente de *como* os animais são tratados, o que é uma das maiores preocupações do público. Para além disso, como ‘generalistas’ (que é aquilo que um cientista de animais de laboratório é, em grande medida), temos conhecimento suficiente de ética, biomedicina, alternativas ao uso de animais e regulamentação para fazer uma análise abrangente da questão, sob vários prismas. Mais, somos inclusive capazes de avaliar questões relacionadas com a experimentação animal sendo críticos de argumentos de um lado e do outro da barricada.
Os investigadores irão ter muita dificuldade se lhes fizerem perguntas que saiam da sua área de especialização, do seu trabalho em concreto. Mas é legítimo pedir-lhes que não se esqueçam de referir a importância que o uso de animais tem para o seu trabalho, com a vantagem de mostrar a experimentação animal como um meio, e não um fim último, como muitas vezes é representada pelos seus críticos.
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